Dom Egidio Bisol, bispo da Diocese de Afogados da Ingazeira, comenta sobre a renúncia do papa Bento XVI e admite que a Igreja não é feita de “super-heróis”. Ele avalia que Joseph Ratzinger não abandonou sua missão ao largar o papado, mas apenas deixou um serviço. “Fiquei pensando na grandeza do gesto do papa, na sua coragem e autenticidade e isso me deixou muito sereno”, disse. Confira a conversa do FAROL DE NOTÍCIAS com o bispo Dom Egídio:

FAROL – Como o senhor recebeu o anúncio da renúncia do Papa Bento XVI?

DOM EGÍDIO – Como para todo mundo, foi para mim também uma grande surpresa. É verdade que, vez por outra, se falava sobre o assunto e o próprio Bento XVI tinha lembrado anos atrás a possibilidade, e até a oportunidade, da renúncia do papa em certas circunstâncias, mas eu não pensava que isso de fato pudesse acontecer agora com ele. Depois do primeiro impacto, porém, fiquei pensando na grandeza do gesto do papa, na sua coragem e autenticidade e isso me deixou muito sereno.

FAROL – As justificativas para renunciar, entre elas, o peso da idade, não revela uma fragilidade da Igreja Católica?

DOM EGÍDIO – As razões que o papa apresenta para sua renúncia revelam uma grande consciência que ele tem de si mesmo e da missão que assumiu anos atrás como bispo de Roma e levará adiante até o dia 28 de fevereiro próximo. A Igreja não é feita de “super-homens” e sim de homens de fé que procuram seguir Jesus Cristo e levar adiante o projeto dele no mundo de hoje. Sabemos que a idade avançada traz consigo fragilidades, limitações na possibilidade de trabalhar ou assumir funções que exigem muita energia. A Igreja sempre teve consciência disso: ela, por exemplo, pede aos bispos de renunciar ao governo da diocese ao completar 75 anos.

O papa aplicou a si mesmo, bispo de Roma, o que a Igreja pede aos outros bispos. E o fez olhando não para si mesmo, mas para o bem da Igreja como ele mesmo disse. Para que não faltasse à Igreja universal um Pastor forte, corajoso e firme como ele mesmo foi. Fragilidade, ao meu ver, seria querer continuar assumindo um serviço sem ter mais condições para isso. Autenticidade e humildade nunca serão dentro da Igreja sinal de fragilidade, mas de grande força moral.

FAROL – Esta renúncia não pode abrir precedentes? Padres e bispos não podem utilizar da mesma justificativa para renunciar às suas missões?

DOM EGÍDIO – Mas isso já acontece na Igreja. A Igreja aceita a renúncia de um padre ou bispo que não se sinta mais em condições de continuar seu serviço. Ninguém pode ser obrigado a continuar assumindo um serviço na Igreja se ele mesmo não se sente mais capaz de fazê-lo de forma satisfatória. Não se trata de renunciar á missão, mas de deixar um serviço.   Bento XVI, aliás, já disse que vai continuar sua missão, embora de forma diferente, menos ativa e muito mais contemplativa. Saber deixar espaço para outros na hora certa é sinal de muita sabedoria, coerência, humildade.

FAROL- Existe crise na Igreja com este episódio?

DOM EGÍDIO – Não vejo como esse episódio possa ser sinal de crise na Igreja; pelo contrário, vejo  no gesto do papa a consciência de que o bem da Igreja universal  vai além de sua pessoa. Isso é sinal de que na Igreja o poder é vivido como serviço. Bento XVI, considerado por muitos como conservador, deu um sinal extremamente revolucionário que com certeza marcará a historia da Igreja; nos deu uma lição muito grande mostrando que o serviço é muito mais importante do que o cargo. Isso serve para todos os que exercem alguma função, não só na Igreja, mas também na sociedade toda.