Do JC Online

Foi a violência mais brutal que levou a cantora Renata Péron, mulher trans, a decidir entrar na política. Em 2007, ela foi agredida por nove pessoas na Praça da República, no Centro de São Paulo. Perdeu um rim. Fez terapia. Saiu de lá e quis fazer a diferença. Se filiou ao PSOL e vai disputar o cargo de deputada federal. “Nesse momento em que tantos políticos tentam barrar os direitos LGBT, nós temos que arregaçar as mangas e concorrer. Eu sou uma mulher trans de 41 anos e sempre escuto que o branco cisgênero vai trabalhar pelas minhas causas. Eles nunca fizeram nada”, diz.

Na semana passada, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reconheceu que mulheres trans poderão usar o gênero com o qual se identificam ao registrar as candidaturas, ter assegurado o direito ao nome social e, mais importante, concorrer pelos 30% de candidaturas a deputadas federais e estaduais destinados às mulheres. A Corte ainda vai regulamentar a regra, mas já divulgou que, para isso, mulheres e homens trans precisarão apenas se registrar em um cartório eleitoral até o dia 10 de maio.

Em 2016, 89 pessoas trans disputaram a eleição, segundo dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Apenas 11 se elegeram. O número contrasta com os 179 assassinatos de transexuais registrados pela mesma entidade em 2017. É o maior número desde que os dados começaram a ser compilados em 2008. Em 2018, já são 33 mortes.

“A mulher trans não tem acesso a educação e tem muito mais dificuldade de entrar no mercado de trabalho. Isso gera uma bola de neve social de exclusão. No Brasil, as pessoas trans tem expectativa de vida de 35 anos. Mais de 85% ainda tem como meio de sobrevivência ser profissional do sexo. Não que seja algo pecaminoso ou errado, mas não deve ser a única alternativa de existência de uma população”, se queixa a sergipana Tathiane Araújo. Filiada há dez anos ao PSB, ela é a primeira mulher trans a integrar a Direção Nacional do partido, eleita no último final de semana.
Para serem eleitas

Em Pernambuco, duas mulheres trans disputaram a eleição de 2016. Em Garanhuns, Renata Síndica, do PRB, teve 105 votos para vereadora, mas não se elegeu. Em Palmares, Professora Gil, do Solidariedade, amealhou apenas seis votos. O JC tentou localizar as duas através dos dois partidos, mas não teve retorno.

“Essa decisão que o TSE dá já devia ter vindo a muito tempo. Para nós, é importante que agora não se repita o que aconteceu na última eleição, em que algumas pessoas acabaram sendo eleitas e, ao chegar na Câmara de Vereadores, tiveram problema para ter o nome reconhecido”, registra Keila Simpson, presidente da Antra.

Para Renata Péron, a próxima conquista que a população precisa é convencer os partidos de que podem ser eleitas. “Se eu estou saindo como candidata a deputada federal é porque eu fiz as contas e eu tenho chance de ser eleita. Não sou só para ajudar no coeficiente. E mesmo que eu não seja eleita, quero mostrar para as minhas colegas que elas podem ser o que elas quiserem, não só prostituição. Inclusive deputadas federais.”