24mai2016---como-uma-prisao-assim-e-a-unidade-psiquiatrica-do-hospital-da-capital-da-guiana-georgetown-1464129521730_615x300Em um pequeno estande da GuyExpo, a principal feira da Guiana, o Escritório de Pesticidas e Produtos Químicos Tóxicos, uma agência do governo, tenta atrair visitantes. Um armário com recipientes de vidro contendo líquidos borbulhantes com as cores da bandeira do país (vermelho, preto, verde, branco e amarelo) chama atenção. Alguns chegam e pegam folhetos que alertam: “Lembre-se! Guardar os pesticidas em local adequado pode salvar vidas”.

Em meio à excitação e ao otimismo com a feira, que faz parte das comemorações do 50º aniversário da independência da Guiana, o estande é um lembrete das muitas vidas que foram ceifadas no país devido à ingestão de venenos, herbicidas e pesticidas de fácil acesso. Localizada no litoral norte da América do Sul, a Guiana é um país pequeno, com uma população diversificada de pouco mais de 750 mil. Mas também possui a maior taxa proporcional de suicídio do mundo.

A OMS (Organização Mundial da Saúde) estima que 44,2 em cada 100 mil pessoas se matam na ex-colônia britânica (no Brasil, esse índice é de 5,8 pessoas por 100 mil habitantes).

Estigma

“Ninguém sabe o número exato de suicídios”, ressalva à BBC William Adu-Krow, representante da Opas (Organização Pan-Americana da Saúde) e da OMS na Guiana. “Além disso, acredito que esse número seja subestimado. Por causa do estigma que envolve o suicídio, o paciente que tenta tirar a própria vida não diz que tomou veneno, por exemplo, mas quando chega ao hospital, fala que se sentiu mal e não consegue respirar.”

Na ausência de um centro toxicológico no país, a obtenção de dados confiáveis é ainda mais difícil. “O suicídio é um grande tabu aqui”, diz Bibi Ahamad, vice-presidente da filial guianense da ONG La Voz del Caribe, com sede em Nova York. A ONG usa redes sociais e programas de mensagem como o WhatsApp para se comunicar com pessoas que entram em contato em busca de conselhos e apoio psicológico.

“O número de tentativas de suicídio é muito, muito alto. Por exemplo, falei com uma adolescente que havia tentado se matar seis vezes, mas ninguém lhe ofereceu ajuda, ninguém prestou atenção ao caso dela”, explica Ahamad.

Razões

Um dos casos mais famosos no país foi o do comediante Kirk “Chow Pow” Jardine, que sobreviveu a uma tentativa de suicídio. “Fui viciado em drogas por 21 anos e perdi o interesse na vida em determinado momento”, disse ele à BBC. “Pensei que todos os meus problemas tinham ficado maiores do que eu.” Mas Jardine procurou ajuda e se submeteu a um processo de reabilitação, dando a volta por cima.

“Hoje sou o principal comediante da Guiana. E em vez de lágrimas, faço as pessoas sorrirem”, diz. Mas ele é um dos poucos que têm sorte. Com poucos estudos disponíveis, estabelecer as razões por trás da alta taxa de suicídio é difícil. Um levantamento feito com sobreviventes de suicídio no hospital público de Georgetown, capital do país, constatou que os principais fatores são geralmente desavenças familiares, problemas de relacionamento e violência doméstica.

Outros mencionam a pressão dos colegas, o preconceito contra a comunidade LGBT, a pobreza, a desigualdade no acesso à educação e à saúde, e até mesmo a glorificação do suicídio em filmes e novelas da Índia, o chamado “efeito de Bollywood” (mais de 65% dos casos ocorrem dentro da comunidade de imigrantes indianos).

“No ano passado, nós [na Voz del Caribe] nos concentramos principalmente em ações de sensibilização para os sinais de alerta, mitos e desinformação”, diz Ahamad. “Mas decidimos focar em questões como alcoolismo e dependência de drogas, estupro, incesto e gravidez na adolescência”.

Do Portal Uol