cegueiraPor Luciano Menezes, professor com Pós-graduação em História Geral e do Brasil

As mentalidades infantis estão em toda parte e os sofrimentos apenas se expandiram também em virtude das crenças cegas. Chegamos ao grau irreversível das cegueiras: miopias sociais e políticas; cegueiras históricas, filosóficas, ideológicas e religiosas. Quando não somos enganados pelos argumentos mais hábeis, somos fisgados pelas ilusões das “razões” mais simples e vulgares.

Os cegos jamais conseguiram enxergar quem determinou os desprezos aos desprezados. Na irreflexão hereditária, o cego exaltou a grandeza da região, do país mais rico e mais poderoso, desde a exaltação da Europa até as adorações ao modelo EUA de ser. Assim, as cegueiras não exerceram nenhum olhar com densidade histórica, nenhuma análise das gêneses, logo, esse distúrbio visual ocultou silenciosamente a santíssima trindade do comportamento social moderno: rapinam (rapina), furtum (roubo) e usuram (usura).

O fato é que, as sociedades modernas sempre foram sustentadas na atmosfera dos roubos, polarizados entre os odiosos – roubos das classes pobres e, do outro lado, os roubos amáveis – roubos e corrupções legítimas, sob as bençãos das leis e dos cegos. O roubo legítimo inicia-se, como dizia Rousseau, no primeiro cercamento de terra e na crença ingênua do cego, que acreditou que tal terra tinha um dono e não era um bem coletivo. Assim, a miséria mental do cego, juntou-se a miséria material e ele não pode mais se livrar do triste axioma: dois mais dois é quatro.

Atualmente, o cego, ingenuamente repete os jargões: corrupções, crise, desemprego, em desgastes conceituais. As cegueiras adoram as “verdades” das estatísticas, dados e números dos economistas. O senso comum se alimenta cegamente dos números como um caráter de santa verdade, já dizia o historiador Vilas Boas.

O cego, contraditoriamente, enxerga bem as fachadas enganosas e nutre uma esperança na transformação social, mediante o trabalho duro. Com espíritos e ouvidos cativos, o cego acreditou na preguiça do brasileiro, fabricada por uma voz que associou essa “preguiça” a miséria crônica.

O cego é também um consumidor compulsivo dos produtos, das opiniões, das quimeras e fantasias alheias, conformado com as “normalidades” e as aparências, seguindo a lógica do capital, a lógica da economia, a lógica teológica. A crença do cego é imediata, quer seja em relação à ciência, a medicina, a teologia – religião. Sua fé é prática, adquirida na primeira experiência vivenciada, aceitando tudo com evidente e jamais consegue questionar nada. Desse modo, o cego sempre foi uma eterna vítima das suas crenças, não conseguindo ampliar o limitado quadro de visão e, dificilmente atinge a superação do óbvio.

“O conhecimento científico que é colocado como verdade absoluta se sustenta até que outra verdade venha a substituí-lo.” (Thomas Kuhn).