Da Revista Carta Capital

Por Eduardo Newton (Da Carta Capital)

Não possuo qualquer título de nobreza tampouco fui registrado como Juan Carlos. Todavia, me valendo de famosa frase do então Rei de Espanha, trago uma indagação que permeia todo esse escrito. Bolsonaro: por que não te calas. Quiçá motivado por um esforço contínuo em obter espaço na mídia de qualquer jeito, no curso de sete meses de governo, cada vez mais são verificadas aparições do Chefe do Executivo Federal marcadas por afirmações infelizes, polêmicas e, principalmente, absurdas.

A boquirrota autoridade pública em questão já confessou que não teria capacidade para exercer a presidência. Segundo as suas próprias palavras, as suas “caneladas” se justificariam pelo fato de não ter nascido para ser Presidente, mas sim “para ser militar”. Ora, em uma verdadeira república, ninguém nasce com o destino traçado para o mais alto posto do serviço público. Surge, assim, o questionamento: Bolsonaro, por que não te calas?

Por maior que seja o orgulho de um pai com relação a um filho seu, a lógica republicana impede o nepotismo. A existência de uma súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal demonstra a fragilidade da compreensão da sociedade brasileira dessa forma de governo. Aliás, se a manifestação decisória assumida pelo STF não foi capaz de sensibilizar o Chefe do Executivo, deveria, ao menos, poupar a sociedade de uma incessante tentativa de convencimento dos atributos da cria presidencial para chefiar um dos principais postos do Itamaraty.Por isso, persisto:

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Bolsonaro, por que não te calas?

A efetivação da reforma da previdência se aproxima e, não resta dúvida, de que ela aponta para um caráter draconiano. Ao contrário do que tantas vezes veio a ser sustentado pelo Presidente, essa modificação não atende os interesses de grande parte da sociedade. Caso chancelada pelo Congresso Nacional, a aposentadoria se tornará um objeto de desejo inalcançável para muitos brasileiros. Onde está essa melhoria? Como explicar para um assalariado – espécime rara em um mercado de trabalho marcado pela precarização – que o ganho obtido pelo mercado é bom para ele também?

Dessa forma, reitero: Bolsonaro, por que não te calas?

Em um país marcado pelos mais diversos preconceitos, o Presidente da República, até mesmo por não saber manter contatos institucionais com a oposição, demonstrou todo o seu desprezo para com o povo nordestino. Portanto, insisto: Bolsonaro, por que não te calas?

A realidade brasileira comporta um cenário complexo, podendo ser destacados os fortes traços de miséria e que assombrariam qualquer um. Ainda assim, o Presidente da República afirma que não existe fome no Brasil. O problema é real e sério, sendo certo que a superação desse tenebroso horizonte tem como premissa ir além da negação.

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Aliás, já que se mencionou a temática da fome, não se pode ignorar a existência dos famintos de humanidade. Apesar de humanos, são seres que se mostram incapazes de reconhecer a existência do outro. Sem sombra de dúvida, o trabalho a ser realizado diante desse específico caso de subnutrição será um dos mais árduos, pois implica ensinar e, principalmente, permitir com que esses famintos venham a aplicar o conceito de empatia.

Até que venha a erradicação desses hipossuficientes, a sociedade conviverá com pessoas que, por meio de bravatas e irascíveis falas, somente se mostram capazes de causar a dor, vide o teratológico ato de zombar da perda de um pai desaparecido no curso da ditadura civil-militar. Continuo com minha jornada monotemática: Bolsonaro, por que não te calas?

No âmbito do Direito Canônico, o silêncio obsequioso é uma sanção imposta a quem se posiciona em contrariedade aos preceitos da Igreja. Nos anos 80, a Teologia da Libertação caiu em desgraça no Vaticano e a um de seus principais nomes foi imposta a citada pena. A pergunta que veio a ser exaustivamente apresentada neste texto demonstra, em síntese, a incapacidade do Presidente atual respeitar o Texto Constitucional, que jurou cumprir ao tomar posse no cargo. Assim, o silêncio tencionado se mostra uma sanção devidamente adequada. Trata-se, portanto, de uma verdadeira responsabilização cívica.

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E, caso isso não se mostre possível sob o argumento de que o Estado é laico, resta o anseio de que, enfim, o Brasil tenha um Chefe do Executivo “terrivelmente mudo”, vez que se trata de pessoa que, no curso de sua vida pública, não soube respeitar os oponentes, vide o caso que ensejou a indenização – e que foi mantida pelo Supremo Tribunal Federal – por ter afirmado que uma deputada federal “não merecia ser estuprada por ser muito feia”.

Enquanto a mudez não chegar, certamente persistirá a necessidade de perguntar: Bolsonaro, por que não te calas?

Em tempo, manifesto a minha solidariedade ao Presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, que conheci nos tempos de graduação quando foi meu professor de Direito do Trabalho. Além do registro de um sentimento não conhecido por determinada categoria de famintos que foram apresentados neste texto, retomo ao meu questionamento: Bolsonaro, por que não te calas?