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Fotos: Farol de Notícias/Alejandro Garcia

Por Paulo César Gomes 

Vivemos em uma época em que muitos produtos comestíveis são enlatados e embalados a vácuo. As carnes distribuídas pela marca Friboi, por exemplo, passam por um criterioso processo de qualidade, até chegar à mesa do consumidor. Todo esse sistema que envolve os produtos industrializados, só demonstra que a evolução das máquinas e as novas tecnologias – quer tornar tudo mais rápido e simples -, mas está retirando do mercado de trabalho a mão de obra sem especialização.

Com base nessa premissa, eu e o meu inseparável companheiro de jornadas, Alejandro García, embarcamos em universo primitivo, mas de uma sensibilidade ímpar. Na reportagem de hoje da série “Profissões Perdidas”, percorremos através das imagens do nosso genial repórter fotográfico do FAROL, e das declarações de um grupo de mulheres guerreiras e destemidas, o mundo das “fateiras de Serra Talhada”.

Não existe um estudo aprovado sobre o tema, que pudesse nos dar uma luz sobre a origem dessa profissão. Porém, segundo alguns pesquisadores, o aproveitamento das vísceras de animais para o consumo humano no Brasil, teria se originado no período da escravidão.

Nessa fase horrenda da nossa história, os negros para se alimentar, aproveitavam os que os senhores não queriam dos animais para seu consumo, como bucho, fígado, miolo, rim, coração, estômago, mocotó, língua, tripa, rabo (rabada), entres outros. Dessa mistura nasceram pratos que fazem parte da culinária nacional e regional, como a feijoada, o munguzá e a buchada.

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GUERREIRAS E DESTEMIDAS

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Fateiras trabalham descalças e sem luvas

Foi em tarde de céu nublado que nos encontramos com “as fateiras” em um local entre o Matadouro Público e as margens do Rio Pajeú, no bairro Bom Jesus. Educadamente fomos recebidas pelas senhoras, um grupo composto de seis, que mesmo diante da precariedade do ambiente, se demonstraram orgulhosas pela profissão que exercem.

“Sou fateira a mais de 50 anos e foi daqui que eu tirei o sustento para criar meus 9 filhos”, relata dona Maria de Jurandir, a mais velha e líder do grupo. O trabalho é divido em duas etapas. “Um grupo trabalha lá dentro do Matadouro e outro fica aqui, fazendo a limpeza”, esclarece dona Maria, que acrescenta que homens também ajudam na dura tarefa.

E entre fornos, caldeirões com água fervendo, facas, um varal cheio de tripas (intestino) e um odor que chegar a ser insuportável, que dona Maria leva a vida. Uma rotina que vai de domingo a sábado, e começa às 12h e se estende até as 18h, e dependendo da demanda, pode chegar até as 22 h. “Tem dias que sinto muitas dores nas costas, na cabeça, e têm dias que é no corpo todo”, confessa Maria Jurandir, que mesmo com todo esse histórico de trabalho ainda não é aposentada.

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Estes mesmo sintomas também são sentidos por Marluce Dias, mãe de 3 filhos, e que trabalha no local a bastante tempo. Segundo Marluce, a tarefas dela é a seguinte: “Aqui a gente lava e trata de tudo – bucho, fígado, miolo, rim, coração, estômago, mocotó, língua, tripa, rabo – e depois enviamos para os marchantes que vendem o produto”.

BAIXOS PREÇOS PREJUDICAM RENDA 

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Mas todas as mulheres trabalham descalças e sem luvas. “Nunca recebemos orientação ou treinamento”, afirma Marluce. Ela também explica que os marchantes compram o conjunto de vísceras de um animal por R$10, R12 e no máximo R$ 15,00. “O valor pago é dividido entre 11 pessoas”. Segundo Dias, a sua renda chega a pouco mais de R$100,00 por mês, o restante é completado com os programas do governo federal.

Para Maria de Jurandir o pior momento é quando chega à seca, pois a morte de grande parte do rebanho bovino faz com que a atividade dela seja atingida. “Quando chega a seca o dinheiro recebido não dar nem para comprar o sal, e madeira para colocar no fogo é dada pela Tupan”, desabafo dona Maria.

Segundo o responsável pelo Matadouro, Ivanildo, que conversou por telefone com a nossa equipe, existe muita gente para criticar e quase ninguém para ajudar. “As pessoas precisam ver que o Matadouro está gerando emprego e renda. Dando oportunidade para as pessoas que não têm especialização ou conhecimento técnico de trabalharem”, declarou Ivanildo.

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NOTA AOS LEITORES: 

A nossa interação com o grupo de mulheres estava tranquila, era visível a satisfação daquelas senhoras que vivem no anonimato, mas que como todas as outras mulheres brasileiras, independentes de profissões ou status sociais, são dignas de respeito. Infelizmente o nosso trabalho de reportagem e de pesquisa foi interrompido, mesmo estando no local com a autorização do responsável pelo órgão, por um cidadão que não se identificou e nos impediu de continuar a nossa conversa com o grupo de mulheres, que era o nosso principal objetivo.

O cidadão não nos permitiu que tirássemos fotos do local, alegando que estávamos ali sem uma autorização, e que para ele, era com se estivéssemos invadido uma casa. Lamentamos, que um senhor que possui nível desconheça o que seja público e o que seja privado, e muito menos o que seja liberdade de imprensa. Apesar disso, o nosso trabalho está para ser apreciado e criticado pelos nossos queridos leitores!

Um forte abraço e até a próxima reportagem da série PROFISSÕES PERDIDAS!

 

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Dona Maria de Jurandir trabalha há 50 anos como fateira

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Ambiente de trabalho é precário e insalubre

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