Fotos: Amaysa Carvalho/Especial para o Farol

Publicado às 20h desta quarta-feira (13)

Na semana dos professores o Farol de Notícias revela a trajetória do professor de geografia Miguel Leonardo Lima Filho, serra-talhadense de 55 anos que já atua há 31 anos na docência. Miguel, que é filho de agricultores semi-analfabetos, entrou na profissão por um acaso e se apaixonou pelo magistério e hoje tem orgulho do seu trabalho. Também faz palestras voltadas para a educação ambiental. É conhecido em toda a região pela seu diferencial, que é levar a temática caatinga para a sala de aula com poesias.

Miguel Leonardo nasceu na Fazenda Juazeiro em Serra Talhada, tinha o sonho de trabalhar como engenheiro agrônomo, mas surgiu a oportunidade de ingressar na faculdade como bolsista e então começou a cursar geografia em 1985. Foi destaque em sua turma sendo o aluno laureado, ainda buscou trabalhar de outras coisas em São Paulo, mas voltou para Serra e começou a ensinar em 1990, se encontrou na profissão e ainda hoje exerce com satisfação.

“Eu fazia o curso de agropecuária, trabalhava numa empresa no comércio de Serra Talhada, o meu patrão da época sugeriu que eu fizesse faculdade, porque houve uma mudança no curso de agropecuária, era noturno e passou a ser diurno, eu teria que deixar de trabalhar pra concluir o curso, meu patrão disse que se eu fizesse o vestibular e passasse ele iria conseguir uma bolsa de estudos para mim, então escolhi o curso que mais se encaixava comigo, escolhi geografia, fiz o vestibular, passei em 2º lugar, durante a minha trajetória eu me destaquei, fiquei em primeiro lugar na minha turma, fui laureado em 1988. Fui para São Paulo, voltei 6 meses depois e fui até a faculdade e me coloquei a disposição, se tivesse vaga para tirar licença podia me chamar e por incrível que pareça tinha uma vaga aberta, em 1990 eu comecei tirando a licença, então comecei minha trajetória no curso superior, em 1994 ingressei no estado pelo concurso público, em 1998 houve um concurso público na faculdade, eu passei, fiquei na escola estadual e na Fafopst sendo professor de geografia, atualmente já estou aposentado pela Fafopst, mas continuo na ativa pelo estado”, o professor explicou, acrescentando:

“Ser professor foi uma coisa que aconteceu durante o meu percurso, na verdade eu tinha vontade de ser outras coisas, eu pensava em ser engenheiro, agrônomo, veterinário, mas ser professor não estava no meu projeto, mas terminou que eu me apaixonei pela área e hoje com uma certa modéstia eu me sinto bem enquadrado na função. Quando eu olho no retrovisor da minha trajetória, percebo que se eu queria ser um técnico agrícola era para ensinar como plantar, ensinar a cultivar a terra, se eu queria ser engenheiro agrônomo era para ensinar o agricultor como fazer, ou seja, ensinar como, isso já denotava uma trajetória para o magistério, só que eu não sabia que isso era inclinação para magistério”.

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O FILHO DE AGRICULTOR QUE SE TORNOU PROFESSOR

Miguel Leonardo vem de uma família de agricultores, sua mãe sabe escrever e ler, seu pai apenas assina o nome, seus irmãos só estudaram o ensino fundamental, Miguel veio para Serra para estudar e trabalhar, conseguiu se formar na escola, na faculdade e trabalhou por mais de 30 anos formando outros professores. Ele sente orgulho de sua origem, de ter vivenciado a caatinga e de ter como inspiração a trajetória de seus pais.

“Eu sou o único formado lá em casa, os demais só fizeram o primário, no caso até a quarta série de antigamente, que hoje é o quinto ano, um dos meus irmãos é comerciante em São Paulo, outro é comerciante aqui em Serra Talhada e a minha irmã fica na agricultura junto com o esposo na fazenda. Eu sou filho de agricultores semianalfabetos, minha mãe sabe escrever e ler, mas o meu pai praticamente só assina o nome, eu sai dessa base familiar rural e trilhei meus estudos, cheguei a ser professor da Faculdade de Formação de Professores de Serra Talhada, que até pouco tempo era o centro de estudos de maior excelência do Sertão do Pajeú, passei a formar professores, a influenciar uma geração, para mim foi muito interessante, me deu notoriedade ser professor, contribui para a sociedade creio que de uma maneira além do que eu imaginava com o meu trabalho, e ainda hoje continuo porque eu ainda estou no estado sendo professor”, relatou.

O PROFESSOR AMBIENTALISTA 

Além das aulas ele também leva a educação ambiental para outros lugares, participando de palestras, seminários, dentre outros movimentos. O que mais defende é o bioma caatinga, pois percebeu que nos livros didáticos o tema era abordado de uma forma diferente do que ele realmente é. Essa veia ambientalista surgiu através de projetos da igreja católica, que lhe ensinou muito e apresentou outras oportunidades de ensinar para além da sala de aula.

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“Tem uma coisa que faço paralelamente a minha função que são palestras sobre educação ambiental com ênfase ao bioma Caatinga, a questão da sustentabilidade dentro da Caatinga, como que o homem caatingueiro pode sobreviver no bioma apesar das adversidades do clima, apesar das adversidades naturais do ambiente e como fazer isso de maneira sustentável dentro da questão ambiental, social e econômica, faço essas palestras em associações, sindicatos, escolas, universidades, temos esse trabalho voluntário dentro de educação ambiental que também tem me projetado eu creio que seja uma forma de contribuir para além da sala de aula”, Miguel detalhou completando:

“Dentro da igreja católica, através daquelas campanhas da fraternidade, eu me lembro bem que ouvi uma sobre a água e na época o atual bispo Dom Egídio coordenou um trabalho aqui em Serra, em que as escolas foram incorporadas para participar dessa campanha da fraternidade sobre a água, isso foi por volta de 2004, a partir disso eu me engajei de forma mais sistemática, veio também o saudoso padre Afonso que já tinha um trabalho enraizado na questão da educação ambiental e da convivência com o semiárido e tudo isso me estimulou, então foi dentro do seio da igreja católica que eu despertei essa veia. Claro que vem a interação o sindicato rural, interação com ONGs e pessoas como ativistas ambientais que também pensam da mesma maneira e também participando seminários nas universidades. Em momentos que tinha seminários onde a gente começava a ver alguém falar sobre a caatinga, mostrar fotografia, mostrar um olhar diferenciado sobre a caatinga, comecei a ver que de fato a caatinga ela era mostrada diferente no livro didático em relação ao que de fato ela é, comecei a me despertar a partir dos anos 2000 e de lá para cá eu tenho projetado a termo regional sou bem conhecido como caatingueiro e até a nível nacional, já fiz palestras através do Google Meet, fiz alguns trabalhos nessa linha, fazendo entrevistas com pessoas que interagem com essa questão ambiental”.

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PROFESSOR E POETA

Miguel Leonardo também é poeta e começou a escrever aos 15 anos, inicialmente escrevia sobre a caatinga de forma contemplativa, com o passar do tempo começou a fazer criticas ao governo, mostrando problemas sociais. Ele também usa desse mecanismo para levar os assuntos de geografia com poesias e canções, fato que marcou e ainda marca os seus alunos.

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“Comecei a escrever poesia quando ainda era estudante comecei a despertar para escrever contemplando a natureza, veio a fase de juventude veio a veia da poesia crítica, que questiona as mazelas sociais, cheguei a publicar livros, participar em entrevistas nos rádios de Serra, também fui publicado em jornais literários, jornais que são da capital, no caso, jornais estudantis. Na minha fase de jovem, que era um momento até proibido de falar, era proibido falar o que pensava, a gente conseguia se infiltrar nesses jornais e publicar algo criticando o governo, a situação da sociedade, isso chegou a culminar na fundação da Associação dos Poetas do Vale do Pajeú, eu liderei esse movimento, fui o primeiro presidente dessa associação, em 1986, foi desdobrando e chegou ao ponto de hoje ser integrante da Academia Serra-Talhadense de Letras, na qual faço parte desde a fundação, é um órgão que tem projetado Serra Talhada a nível estadual na questão da produção intelectual”, Miguel salientou, completando:

“Eu levava uma flauta doce para a sala de aula, recitava poemas alusivos com a caatinga e também de problemas ambientas é tanto que nessa fase de ensino remoto na pandemia os alunos reclamaram ,”o senhor não está mais recitando poemas”, eu tenho essa prática assim como também escrevia a estrofe, tinha o cuidado de nas minhas aulas vagas ir para as salas dos menores, foi muito marcante, um colega meu dizia assim “Miguel, se você quiser conquistar os alunos comece pelos pequenos, porque quando eles chegarem no 6º ano eles vão estar muito seus amigos”, então eu ia para todas as séries iniciais recitava umas poesias curtas para eles e tocava a flauta doce, até hoje quando os alunos me encontram na rua perguntam se eu ainda toco flautas para os alunos”.