Da Folha de PE

Foi sob o declamar de poesias que familiares, amigos e admiradores se despediram, nesta segunda-feira (1º), do poeta e cronista Miró da Muribeca. Nascido João Flávio Cordeiro da Silva, Miró morreu no domingo (31), aos 61 anos de idade, após enfrentar um câncer agressivo.

O corpo do artista, símbolo das ruas e da poesia urbana recifenses, foi sepultado no Cemitério de Santo Amaro, na área central da capital pernambucana. Durante o cortejo, o público entoou canções da música brasileira, que, em seguida, voltaram a dar lugar às poesias do escritor.

Amigo de Miró, o poeta Wellington de Melo está escrevendo uma biografia sobre a história do artista. “Miró viveu uma vida sinceramente dedicada à poesia”, comentou. O biógrafo também destacou, emocionado, o fato de amigos de Miró que moram em outros estados estarem no Recife no dia da morte do artista.

“É como se todas as energias tivessem convergido. Então, isso dá um pouco a entender essa força da natureza que era Miró. Uma força de poesia. E, como eu disse na cerimônia de despedida, cada coração que ele tocou, ele se multiplicou e se transformou num clone dele mesmo. Então, cada um de nós leva um pouco de Miró”, disse. O velório do artista iniciou na tarde de domingo e seguiu até a manhã desta segunda-feira.

Apesar de a biografia já estar em fase avançada de produção, o livro ainda não possui data de lançamento definida. “A gente acabou adiando o lançamento porque a gente queira acompanhar, a gente achava que era importante perceber todo esse trajeto dele, e entregar aos fãs uma obra que pudesse realmente sintetizar essa vida, se é que é possível fazer isso em uma vida tão grande que era a de Miró”

O escritor pernambucano Marcelino Freire, amigo de longa data de Miró da Muribeca, lembrou que, apesar do luto, o momento é, também, para celebrar a poesia deixada pelo artista. “Uma pessoa que viveu da poesia, a vida inteira pela poesia, para a poesia. Uma pessoa da poesia, espalhando poesia onde você julga que a poesia não esteja, nas vielas insuspeitas, nas esquinas, nos becos. Tudo é contra a poesia. Miró sempre foi a favor da poesia porque é a favor das pessoas, né?”, refletiu.

“É um momento em que a poesia está sendo celebrada e essa poesia vive. Vive porque o Miró se foi mas a poesia dele aqui ficou com a gente. Miró é imortal e não é imortal por causa do chá, é imortal por causa do chão, palavra raiz ninguém arranca. Então, a palavra que ele plantou aqui vai ficar com a gente. É uma saudade grande mas a certeza é de que ele vive. Miró vive”, completou.

Pedagoga de formação, a poeta Magda Alves, de 24 anos, voltou de Garanhuns, no agreste pernambucano, a tempo de se despedir do ídolo. “Para mim é um privilégio ter tido a chance de conhecer o meu poeta preferido e de ele ser uma pessoa que me representa muito, na fala, na expressão, na cor. Esse amor e ódio pela cidade, essa poesia crua, é realmente algo que me tocou e me toca sempre”, contou.

Em 2019, lembrou a jovem, ela teve a oportunidade de declamar um poema para o próprio artista. “Eu tive a chance, essa oportunidade, esse privilégio, de declamar para ele. No sol da [Avenida] Dantas Barreto, eu tive essa experiência que foi muito mágica e muito importante”, recordou.