Do G1

Talvez o maior modelo político, ideológico e comportamental de Jair Bolsonaro, Donald Trump não parecia levar muito a sério o coronavírus até que, na quarta-feira, anunciou o fechamento do país a voos que partem da Europa. Como é do feitio dos políticos radicais, tentou usar politicamente a medida: estabeleceu uma exceção para a Grã-Bretanha do aliado Boris Johnson, como se ingleses, escoceses etc. não tivessem o mesmo poder de disseminar o vírus. Na sexta, foi obrigado a decretar “emergência nacional” e tomar uma série de medidas importantes.

O presidente brasileiro, nacional-populista de raiz, no figurino de Trump, deve ter tido vontade de chamar o patógeno da pandemia de “vírus estrangeiro”, imitando o presidente americano. Mas não há informação de que tenha criado empecilho a qualquer das decisões adequadas que vêm sendo tomadas pelo seu ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e por outras áreas do governo.

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Os erros de Bolsonaro, reforçados ontem, são de outra ordem, tão ou mais graves: demonstrações de irresponsabilidade política e pessoal. O presidente entrou em terreno institucionalmente perigoso, na última semana de fevereiro, ao fim do carnaval, quando ajudou a divulgar por sua conta de WhatsApp a convocação de manifestações contra o Congresso e o Supremo realizadas ontem em algumas cidades. De sentido golpista. Inconstitucionais, ilegais.

Inspirado numa reação dura do ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, contra o Congresso, registrada sem seu consentimento, o movimento, por absurdo, passou a ter o apoio do presidente da República, referendando assim um ataque às instituições. Diante das reações negativas à sua atitude, Bolsonaro ensaiou um dúbio recuo. E ontem tirou qualquer dúvida, se havia, sobre sua verdadeira posição em favor de um ato político intoxicado de ilegalidades. Tornou-se cúmplice.

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O presidente deixou de ficar muito perto da claque que o acompanha em frente ao Alvorada. Não deveria permitir sequer esta aglomeração, se obedecesse às instruções do próprio Ministério da Saúde. Mas ontem aproximou-se de manifestantes na calçada do Planalto e ainda tocou na mão de alguns. Com este gesto conseguiu ser duplamente irresponsável: deu mau exemplo à população, que vem sendo instruída a evitar esses contatos, e atacou a democracia.

O tamanho da falta de sensatez de Bolsonaro, no plano pessoal, pode ser medido pelo fato de que, também no domingo, foi informada mais uma contaminação pelo coronavírus na comitiva que viajou com ele aos Estados Unidos. Seu primeiro teste foi negativo. Serão feitos outros. Por óbvio, deveria se precaver.

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Quanto ao aspecto político, deverá haver desdobramentos, com a finalidade de que o Planalto respeite os limites que a Carta estabelece ao Executivo.