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Foto: Farol Imagem

Representantes da cultura hip hop na capital do xaxado estão indignados com a falta de apoio da Secretaria de Cultura de Serra Talhada, administrada pelo pesquisador do cangaço, Anildomá Willams. Um dos principais representantes do breakdance na cidade, MC Clovinho Brown buscou a redação do FAROL para desabafar sobre a ausência de incentivo por parte do poder público. Para ele, apenas o xaxado vem recebendo destaque e apoios.

Brow é um dos nomes mais importantes do movimento hip-hop na Capital do Xaxado e tem enfrentado dificuldades para montar eventos em favor da juventude. Mesmo assim não tem desistido. Tomando isso como uma missão, o MC juntou outros “brothers” da resistência cultural para promover um grande evento: o 4º Campeonato Hip-Hop de Serra Talhada.

Para esta edição do projeto estão sendo esperados grandes nomes nacionais do breakdance. Um deles é o B-boy Ratin, participante do renomado campeonato internacional Red Bull BC One. O evento está marcado para começar às 18h deste sábado (8) na quadra de esportes do bairro Bom Jesus.

A entrevista foi concedida a nova estagiária do Farol, Emmanuelle Karla, estudante de Letras da Uast/UFRPE. Vale a pena conferir!

ENTREVISTA – MC Clovinho Brown

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FAROL – Como anda o movimento cultural do hip-hop em Serra Talhada?

MC BROW: Meu nome é Clovinho Brown , representante da cultura hip hop em Serra Talhada. Uma das culturas que, de certa forma, a Secretaria de Cultura e a Casa da Cultura não nos dá apoio nenhum, porque eles imaginam que é uma cultura de marginalidade. Mas eu acho que qualquer tipo de dança, qualquer tipo de jogo de cintura, qualquer manifestação afro é cultura.

Com esse projeto que a gente vem incentivando os garotos, o jovem está engajando-se em cultura e saindo das drogas no bairro Bom Jesus, eles estão com a mente visada naquilo, na dança… Ficam admirados com a dança.

Então eu acho que tudo tem que ter cultura, mas para que isso permaneça com essa grande cultura, com essa grande evolução do hip hop em Serra Talhada, precisamos de apoio. Coisa que na nossa cidade de Serra Talhada, não temos, para a cultura Hip Hop não temos.

FAROL: Você procurou fechar parcerias com instituições e secretarias?

MC BROW: Isso, eu procurei o secretário de Cultura, mas aí fica aquela coisa de não dar apoio geral do que a gente precisa. Eu acho que, quando você recebe um cargo como secretário de Cultura você deve incentivar todas as culturas. Todas elas, então se você é secretário de Cultura você tem que se envolver e abraçar a situação e realmente interagir geral.

Porque a secretaria de Cultura é feita para isso. A gente correu atrás e eles diziam ’vou falar com fulano, vou fazer isso’. Eu fui lá (Secretaria de Cultura) algumas vezes e ficou nesse vai e volta, então, certo dia, o procurei e tivemos um diálogo meio pesado…

FAROL: E qual foi a resposta que você obteve da Secretaria de Cultura?

MC BROW: Ele falou que foi privado algumas situações, porque não poderia nos dar apoio no momento, por conta de despesas que, de repente a prefeitura teve. Eu não tenho muito conhecimento no lado político, mas quando se tem uma prefeitura ela tem, realmente, um dinheiro exclusivo para a cultura.

E nós somos cultura, meu velho. Nosso dinheiro está onde? Será que está envolvido na política? Esse é um desabafo de um cidadão de bem, eu estou defendendo as minhas raízes e vou defender, porque eu não quero deixar história, não quero deixar ibope, mas quero deixar bem claro: o hip hop é cultura sim, se você não quer aceitar, você engula.

Engula a cultura hip hop em Serra Talhada. Eu acho que cultura, ela desde as pessoas correndo e desenvolvendo seus objetivos e projetos; todas as entidades que dão apoio às crianças nas danças e tal, tudo isso é cultura.

FAROL: Então, se teve um retorno negativo da Secretaria de Cultura, como você vem conseguindo financiamento para o campeonato?

MC BROW: Supermercados ajudas, vários supermercados. A gente vai divulgar a marca do patrocinador, do estabelecimento. A gente corre atrás de alguns vereadores para ver se eles se envolvem também e tal. Alguns fala que não podem no momento, outros chegam com alguma quantia. Agora mesmo eu estou vindo de Nailson Gomes e ele me falou que estava numa situação assim, assunto particular,  mas não deixou de ajudar, com certeza.

Manoel Enfermeiro também, a gente corre atrás. Tem o vereador Cição que falou que sempre que precisar tá presente. Eu acho que no nosso bairro deveria ter um representante geral, um vereador que tomasse frente geral. Tudo bem que eles ajudam, a gente agradece. Mas vereador do bairro, ele tem que enxergar o bairro, fazer uma entidade, fazer alguma coisa pelo bairro.

FAROL: Como acontecerá o campeonato de hip hop que você está promovendo?

MC BROW: A gente faz aqui na rua quatro, no Alto do Bom Jesus. Sempre a gente começa entre 18h às 19h, a gente começa esse campeonato e a gente tem, realmente, algumas participações do pessoal do rap; grafite que a gente faz também; tem o DJ Mais da Brigada Hip Hop de Recife que vem pra mandar um som pra os b-boys dançarem, vem exclusivo para esse evento. Então, é um campeonato bacana, a gente começou na brincadeira. Eu morava em Recife e tenho um grupo fechado lá com o PE Original Style Crew e também a Soul da Favela.

Eu acho que assim, independente se eu seja de Serra Talhada ou que eu seja um descendente de cangaceiro, eu tenho que dançar o que eu curto, fazer o que eu curto. Não é por que eu sou descendente de cangaceiro que eu tenho que só dançar xaxado, como se em Serra Talhada só tivesse isso. Parece que a única imagem que se tem da cidade…

Você vai pra uma festa de setembro, tem as apresentações, aí vem só xaxado. Xaxado no começo, no meio e no fim! E as outras culturas ficam onde? Nós temos acesso a todas as culturas, porque o cidadão tem o direito de subir e descer, liberdade de criar e produzir várias culturas, danças… e não ficar só numa coisa.

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FAROL: O teu projeto é essencialmente no Alto do Bom Jesus ou envolve outras comunidades?

MC BROW: Olha, o foco dele é no Alto do Bom Jesus. Eu sou do Alto, moro no Alto e represento o Alto do Bom Jesus. Por isso o foco é lá.

FAROL: Como acontecerá o 4º campeonato da Hip Hop de Serra Talhada?

MC BROW: Ano passado conseguimos trazer pessoas de várias cidades, São Paulo, Recife, Fortaleza, Caruaru, Garanhuns, João Pessoa dos B-boys que dançam. Esse ano, amanhã mesmo está chegando o Ratin do Killa Rocks SP, o brasileiro que teve a participação no Red Bull BC One, representando, ele é de Ribeirão Preto, o cara é da hora. O B-boy Mario do PE original style RE, ele é de Recife, vem representar, o Matheusinho do perfect style CE, ele vão ser o júri.

Esse ano a gente vai ter uma batalha dos MCs, debatendo nas linguagens do Rap e nós temos a participação do Rapper Okado, tanto canta Rap quanto faz grafite, estava também representando o Recife no Brasil Red Bull BC One, vai tá aqui presente com a gente. E esse brother meu, esse africano, vem do Senegal e já está em Recife e vem cantar Rap pra gente, mandar um som diferente, uma ideologia diferente.

FAROL: E como você percebe a cultura Hip Hop, enquanto organizador desse campeonato?

MC BROW: A nossa cultura Hip Hop, assim, não vejo só a cultura hip hop. Porque no meu evento tem um brother meu que vem cantar funk, então o que é que funk tem a ver com hip hop? Tem tudo. O que é que o funk tem a ver com forró? Tem tudo. O que é que o hip hop tem a ver com o forró, com o xaxado. Tem tudo.

FAROL: Como os interessados em fazer inscrições para competir no campeonato? Você desenvolve esse projeto sozinho ou tem outros organizadores?

MC BROW: Olha, eu tenho o meu parceiro, o Júlio César – b-boy Killer que a gente tá junto desde o primeiro campeonato, a gente corre atrás do pessoal do bairro, pede ajuda aos supermercados e patrocinadores. E a gente tá junto em tudo, financeiro, tudo. Quando tem prejuízo a gente ajuda, desembolsa alguma grana.

FAROL: No cartaz do evento diz que o seu projeto ajuda os jovens a sair das drogas por meio da cultura hip hop. Como vocês desenvolvem esse trabalho?

MC BROW: A droga é uma das coisas principais que a gente fica teclando, porque infelizmente o governo em geral não toma providências melhores. Então, a gente envolve as drogas, porque o hip hop é uma cultura onde as pessoas pensam que nós somos usuários de drogas. Então, eu carrego isso nas minhas costas. “Ah, hip hop é droga…” Se eu tenho algumas tatuagens no meu corpo eu sou um drogado? E eu gosto de fazer palestras, tem um dos participantes da minha equipe, que nós temos um diálogo bem interessante nesse sentido, de incentivar o gosto pela dança e a deixar qualquer tipo de vício. E dança tem esse poder.

Em um dos eventos, um participante chegou com um cigarro de nicotina, normal e eu falei para ele se retirar da nossa roda de dança. Não é preconceito com quem fuma o cigarro ou usa drogas, mas eu acho que pega mal para um projeto que defende o não uso. Você está em um estabelecimento com crianças e você tem realmente que respeitar. Porque no meu mundo, se eu uso drogas, eu não sou ninguém para falar para você: não use drogas. Se eu uso eu sou quem para falar isso? Eu não uso drogas, eu sou uma pessoa certa para falar isso.

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