Goottembergue Mangueira é professor e ex- diretor da escola Antonio Timóteo de Serra Talhada

A leitura é uma fonte inesgotável de prazer e uma interação constante com o mundo. Lembro-me quando ainda criança, a professora nos incentiva a ler Monteiro Lobato, Ana Maria Machado e outros através da literatura infanto-juvenil. A biblioteca era para mim um lugar de refúgio daquelas aulas conceituais de língua portuguesa, pautadas quase sempre no ensino da gramática normativa, ligado à linguagem como EXPRESSÃO DO PENSAMENTO. Lá, na biblioteca, eu me sentia à vontade para escolher meus livros e mergulhar no mundo imaginário dos contos e das fábulas, longe da difícil realidade de uma criança cheia de traumas marcados por diversos problemas familiares, dentre outros que tiravam um pouco a doce alegria de viver.

Os livros se constituíram na minha infância, companheiros com os quais eu poderia “conversar” o tempo todo e através deles conhecer outros universos, outras realidades sociais e culturais, dialogar com vozes de várias épocas, realizar-me em cada linha e páginas lidas. Aquele universo de sonho amenizava a minha tristeza, me conduzia a lugares que só a leitura pode nos levar. Foi assim, sem imposição, que adquiri o gosto pela leitura, longe da CONCEPÇÃO ESTRUTURALISTA de ensino de leitura que bloqueia o “diálogo” do leitor com o texto , que entendi a importância do ato de ler, que passei a reverenciar os livros , compreender as suas palavras, suas emoções e lições de vida que guardo até hoje.

Depois de tanto tempo, já adulto, nas minhas “conversas” com João Wanderlei Geraldi, através do livro “o texto na sala de aula, Marcos Bagno (Língua oculta) e, principalmente, Michail Bakthin (Maxismo Filosofia e Linguagem, o grande mestre da linguística enunciativa) é que pude conhecer a verdadeira dimensão do que acontecia personagens desses geniais escritores e comigo nos tempos de criança, no que se refere a leituras dialógicas – discursivas que inconscientemente eu fazia na biblioteca. Hoje, entendo que ler é um ato social e que os textos são partituras de interações, um lugar onde minha mente se plurivocaliza com os discursos ali presentes, constituindo a minha formação discursiva diante do mundo.

“Os livros se constituíram na minha infância, companheiros com os quais eu poderia conversar o tempo todo e através deles conhecer outros universos, outras realidades sociais e culturais, dialogar com vozes de várias épocas, realizar-me em cada linha e páginas lidas. Aquele universo de sonho amenizava a minha tristeza, me conduzia a lugares que só a leitura pode nos levar”.

Na condição de professor, sigo o pensamento e Bakthin, que vê a língua como um LUGAR DE INTERAÇÃO. Os alunos devem ter liberdade para escolher com quem pretendem interagir. Se não querem ler Lobato, Ruth Rocha, que leiam gibi, cordel, poemas, charge, horóscopo e outros. O importante nesse processo é o gosto que o aluno vai adquirir pela leitura Esse é o grande objetivo. A leitura não deve ser vista como uma tarefa a ser cumprida, mas um ato constante de prazer. Os professores, não só de língua portuguesa, precisam refletir sobre o ensino de leitura e compreensão textual, no sentido de garantir aos nossos alunos a realização de atividades que produzam efeitos positivos, para que, assim, não fiquemos a vida toda vendo nossas crianças correrem com medo da leitura como o diabo corre da cruz.

É necessário, ainda, que os professores desenvolvam uma intimidade com os textos utilizados junto a seus alunos e possuam justificativas claras para a sua adoção. Não obterão resultados aqueles que impõem aos alunos alguns textos que nem ele mesmo conhece as especificidades dos gêneros dessas unidades linguísticas, como: macroproposições das tipologias, aceitabilidade, intencionalidade, domínios discursivos, contexto, situação e mais: precisam também conhecer a sua origem histórica e situá-los dentro de uma sequência típica. Essa intimidade e esse conhecimento exigem que os professores se situem na condição de leitores, pois sem o testemunho vivo de convivência com os textos ao nível da docência não existe como alimentar a leitura junto aos alunos.