Por Cícero Lopes, secretário-Executivo de Desenvolvimento Social e mestre pela Unicap

A sociedade serratalhadense estará discutindo nesta semana “A Situação da Violência Contra a Mulher no Município de Serra Talhada”, tema bastante relevante no contexto de uma sociedade marcada pela “dominação masculina” (CORRÊA, 1999; PERROT, 2007). A complexidade do problema já pode ser diagnosticada tomando como fonte o próprio FAROL DE NOTÍCIAS.

Em 16/09 deste ano uma reportagem alertava que “Pernambuco ocupa o 10ª lugar no ranking de violência contra a mulher” e que “Em cada 100 mil mulheres, 5,5 são assassinadas por ano no Estado”. Dias depois, em 09/10, a manchete (re) situava a problemática no contexto local: “VIOLÊNCIA DOMÉSTICA: Três mulheres são agredidas em menos de 24h em ST”. O que demonstra, de fato, a gravidade do assunto.

Na verdade, a dominação de gênero diz respeito a uma problemática recorrente em todos os tempos e espaços. Por exemplo, no séc. XIX as mulheres inglesas foram tratadas como “um problema social” simplesmente por viverem sozinhas. Na Arábia Saudita nestes últimos anos (2008) foi ratificado o “fatwa”, um édito religioso que proíbe a mulher de sair à rua sem usar um lenço que lhe oculte todo o rosto, deixando apenas um olho livre para se guiar. A justificativa é de que mostrar os dois olhos atraem demasiada atenção dos homens, o que demonstra um comportamento corruptível de uma mulher, além de poder instigar as demais a usarem maquiagem, que também é proibido no país.

De modo que é possível entrever que na base da situação de violência contra a mulher se encontra uma violência simbólica, que a coloca como um ser menos capaz, frágil e inferior ao masculino. A crítica que decorre é que estas relações de poder estabelecidas entre homens e mulheres não são da ordem natural das coisas, mas sim, uma construção social, cultural e mental (BOURDIEU, 2003; SAYÃO, 2003). É preciso perceber que existe um sistema de violência e dominação simbólica que legitima a dominação e a marginalização da mulher, reproduzidas até mesmo inconscientemente.

A mulher foi, e ainda é hoje, vitima deste sistema, que a colocou a margem da sociedade. Com base na diferença dos sexos, o androcentrismo e o patriarcado colocaram o homem/macho como referencial, relegando a mulher a condição de coadjuvante, desautorizando assim, o seu direito de exercer funções de poder na história (REIMER, 2005). O desafio então é desnaturalizar e desfatalizar uma milenar estrutura de dominação e poder masculino.

E nesta perspectiva que hoje podemos enxergar os movimentos, hermenêuticas e pedagogias feministas, no esforço de desconstruir as relações de dominação que colocam o masculino como princípio e medida de todas as coisas. A Lei nº11.340, 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha) já representa uma importante contribuição teórica e política de desnaturalizar estas relações de dominação entre homens e mulheres, mas ainda dá seus primeiros passos, e carece de um Estado forte na efetivação dos Direitos Humanos Universais.

Por certo, a concretização de um Estado de direito que assegure a “igualdade”, a “liberdade” e “relações justas” entre homens e mulheres, permanece como um grande desafio. Daí a importância da referida Audiência Pública promovida pela Secretaria da Mulher em parceria com o Ministério Público, Conselho Municipal de Segurança e Poder Legislativo, com clara intencionalidade de possibilitar o fortalecimento da rede protetiva de mulheres vítimas de violência em Serra Talhada e assegurar os direitos humanos fundamentais a todos os cidadãos.