Por Cícero Lopes, professor, teólogo e mestrando em Ciência das Religiões

A “Quarta-Feira de Cinzas” marca a abertura do tempo da Quaresma para os cristãos católicos do mundo inteiro. A Quaresma é o período de 40 dias que antecedem à Páscoa da Ressurreição. Começa hoje e termina com a missa da Ceia, na quinta-feira da Semana Santa.

Antigamente era um período maior através do qual os catecúmenos se preparavam para receber o Batismo na noite da Páscoa (MISSÃO DOMINICAL, 1995).

É marcado pela prática da penitência, silêncio, oração, jejum e caridade. Neste tempo a Igreja Católica também lança a Campanha da Fraternidade, que este ano trata sobre a Juventude (CNBB, 2012).

No entanto, cabem algumas observações sobre o verdadeiro sentido da Quarta-Feira de Cinzas e da Quaresma no contexto da sociedade moderna. Tecer sobre temas como “contrição”, “conversão, “esvaziamento”, “jejum”, “humildade” e “oração” etc. nos dias de hoje é, no mínimo, incomum; pois as pessoas do nosso tempo estão, cada vez mais, habituadas ao espetáculo, ao consumismo, ao prazer e a tentação da auto-suficiência.

“Tu és pó, e ao pó voltarás” (Gn 3,19), diz a liturgia católica deste dia, colocando em xeque os sonhos de notoriedade e prestígio dos homens hodiernos. E é precisamente nesta conjugação que a “Quarta-Feira de Cinzas” faz todo sentido, pois apenas os “pobres de espírito” e os “puros de coração” verão a Deus (Mt 5, 1-12).

“A Quaresma é o período de 40 dias que antecedem à Páscoa da Ressurreição. Começa hoje e termina com a missa da Ceia, na quinta-feira da Semana Santa. Antigamente era um período maior através do qual os catecúmenos se preparavam para receber o Batismo na noite da Páscoa”

Outra coisa importante ainda é saber que o que define a “Quarta-Feira de Cinzas” não é seu sentido deprimente e lagrimoso de “quarta-feita ingrata”, como dizem alguns; mas sim, seu sentido de alegria e libertação de um círculo triste e limitado de amor ao poder, ao dinheiro, à fama, ao sexo livre e a presunção pessoal etc. (CENCINI, 2004).

Algo que andamos esquecendo na mensagem cristã hoje é que a proposta de Jesus não é de poder e ambição, mas de entrega e abnegação: “Se alguém quiser me seguir, renuncie-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (Mt 16, 24), de modo que, ser cristão é deixar-se formar pela cruz de Cristo e amar à maneira divida, incondicionalmente. O Cristianismo é, por excelência, a Religião do exercício da doação (Lc 10, 25-37) e da humildade (1Pd 5,5), sem as quais, não alcançamos o paraíso.

Finalmente, se Jesus passou pela experiência do deserto, do jejum e da oração (Mt 4,1-11), também nós podemos passar, e unir nossas dores aos sofrimentos Dele (Cl 1, 24). Teologicamente falando, somos convidados hoje a nos conformarmos em sua morte, para depois nos conformarmos também em sua ressurreição. E este é, precisamente, o verdadeiro sentido deste dia, onde iniciamos a caminhada para a Páscoa da vida!!!

Fica uma pequena estória para refletir mais:

“Um jovem pastor, nos Alpes, quando cuidava do seu rebanho viu no solo uma flor estranha; apanhou-a e com isto abriu-se uma porta na encosta do morro. O jovem entrou então e deparou com uma estupenda cova de coisas preciosas no meio das quais havia um anão que lhe disse:

– TOMA O QUE VOCÊ QUISER, MAS NÃO SE ESQUEÇA DO MELHOR.

O jovem, encurvando-se para apanhar tanta riqueza, deixou cair a flor e chegando lá fora lembrou-se do que lhe dissera o anão, mas em vão tentou voltar para buscá-la; a porta estava fechada e todas as jóias desapareceram.

Toma o que você quiser e puder dos tesouros deste mundo; todavia, não se esqueça do melhor. O melhor de tudo é Jesus Cristo”.

 _________________________________________________________

REFERÊNCIAS

CENCINI, Amedeo. O respiro da vida: a graça da formação permanente. São Paulo: Paulinas, 2004.

MISSÃO DOMINICAL. Missão da assembléia cristã. São Paulo: Paulinas, 1995.

CNBB. Campanha da Fraternidade 2013: texto-base. Brasília, Edições CNBB, 2012.