Ele é alto, tem barriga de mármore e cabeça pontuda. Mora na Praça Sérgio Magalhães, um dos poucos cartões postais da cidade. Vive debaixo de sol e chuva. Não dorme, não fala, não sente fome. Como todo monstro, carrega o estigma de assustar pessoas. Principalmente turistas. Assim o faz, não por vontade própria, mas por culpa do poder público municipal. Às vésperas de comemorar 160 anos de emancipação política, na próxima sexta-feira (6), Serra Talhada tem o desprazer de conviver com o “Monstrengo Obelisco”. Que já foi bonito um dia. 

Na verdade, o “Monstrengo Obelisco” era um príncipe. Nasceu garboso durante o governo do ex-prefeito Geni Pereira. Tragicamente veio ao mundo com a função de marcar os 150 anos da Capital do Xaxado. Mal sabia ele que, uma década depois, estaria esquecido, depredado e subjugado a servir de painel para cartazes publicitários. Até mesmo da própria prefeitura.

A ideia de criar um marco simbólico para a cidade partiu do ex-prefeito Luiz Lorena, que se empenhou como ninguém no intuito de concretizar o projeto. Em 2009, na tentativa de salvar o Obelisco da transfiguração, o vereador Zé Pereira (PT) solicitou ao prefeito Carlos Evandro a restauração urgente da obra. “Justifico o pleito tendo em vista esta solicitação para a preservação do monumento que é um dos cartões postais da nossa cidade. Lembrar que o mesmo foi sugerido pelo saudoso Luiz Lorena”, divulga o vereador, em seu blog.  

A indicação entrou como emenda ao orçamento para o ano de 2011, no valor de R$ 1500, tendo a Secretaria de Obras a responsabilidade de restaurar o símbolo. No entanto, até agora, nenhuma inicitiva foi tomada. E o que deveria ser um marco artístico, tornou-se um verdadeiro desastre, um “Frankstein” arquitetônico.

 
 
 

Desrespeito: Governo Municipal usa obelisco para divulgar a festa da cidade

CONTRADIÇÃO 

Painel de pichação e fixação de cartazes. Essa a principal função, hoje, do obelisco de Serra Talhada. A ausência de fiscalização representa um dos maiores motivos da perpetuação desse quadro. Por lei, é atribuição direta da Guarda Municipal zelar pela preservação do patrimônio da cidade. No entanto, como impedir se um dos autores da infração é o próprio Governo Municipal? Atualmente, quem olhar o Obelisco poderá ler o conteúdo de vários panfletos, entre eles, o da prefeitura, que aproveitou o espaço para anunciar a festa dos 160 anos. 

De acordo com a Lei Orgânica do município, o Governo Munical deve proteger o patrimônio público, cultural, paisagístico e arquitetônico. A norma prevê sanções para atos relativos “à evasão, destruição, descaracterização dos bens de interesse histórico, artístico, cultural, arquitetônico ou ambiental.” Entre outros pontos, exige a “recuperação, restauração e reposição do bem extraviado ou danificado.”  

Mesmo sem saber o que significa o monumento, a dona de casa, Francisca Maria Quirino, de 46 anos, defende a preservação da obra. “É um cartão postal da cidade. Todo mundo que vem para cá (Praça Sérgio Magalhães) acaba vendo isso desse jeito. Está muito feio mesmo”, afirma. “Parece um monstro, dona Francisca?” “Ave Maria, só falta correr atrás da gente”, responde, sorrindo. Esta semana, a cidade deve enfeitar-se. Varrer suas ruas, pintar suas casas, pendurar bandeirinhas. A missão é fingir que monstros existem apenas em livros ou filmes de terror. Mas quando tudo acabar, o nosso bom e verdadeiro “monstrengo” vai estar lá, provando que a realidade pode ser, incontestavelmente, horrorosa. 

  

*Saiba mais sobre a história dos obeliscos clicando aqui e aqui  

*Fotos: João Diniz de Carvalho