Por Manu Silva, repórter do Farol de Notícias

Publicado às 05h05 desta segunda-feira (8))

O Estado brasileiro é conivente e mais que responsável pelo genocídio da população negra e não é de hoje. A soberania de escolher quem pode morrer sempre vitimou pretos, pobres, mulheres, indígenas e LGBTIs na história do nosso país. Caberiam mais classes nessa lista, mas vamos nos ater nesse texto aos negros, já que o debate antirracista entrou em alta novamente, contratando com os índices de mortes violentas de pessoas negras que nunca ‘saiu de moda’.

Para além de Marielle Franco, George Floyd, o norte-americano morto asfixiado por um policial ajoelhado em cima dele; João Pedro, o adolescente carioca morto em uma operação da Polícia Federal e seu corpo levado ao IML escondido dos familiares que sequer tiveram notícias do garoto por horas; Pedro Henrique morto asfixiado com uma gravata em 2019 por um segurança de shopping e mais alguns casos que ganharam fama na mídia para alimentar um pouco o movimento negro; o que me motivou a voltar a escrever sobre o assunto foi um caso de racismo velado, aparentemente não foi uma instituição, um sistema se movendo e escancarando o racismo estrutural, mas uma relação de patroa e empregada, que está completamente enraizada na memória escravagista do país.

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Relação essa que esconde todo o ranço escravocrata. Ao ler todas as reportagens que as grandes redes de informação têm publicado sobre o incidente com o pequeno Miguel Otávio, de 5 anos, tenho sentido tanta raiva e dor. Todo o mundo está inquieto e repugnado com esses homicídios de pessoas negras, como não ficar? Me preocupo com os outros casos que ocorrem cotidianamente e são naturalizados, passam sem ninguém ver. Corpos que somem no breu da ignorância humana.

Me preocupo mais ainda com a forma que a Justiça pernambucana está lidando com o caso. Mesmo pecando por intransigência, compreendo que uma mulher adulta sabe exatamente as consequências de deixar uma criança de apenas 5 anos sozinha. Se confinada em uma casa já riscos de morte, que dirá em um elevador sozinha. É crueldade, inconsequência. As penas para réus de violências contra as minorias só terão alguma chance de reeducar e causar medo quando forem interpretadas como dolo.

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Qualquer pessoa no mundo saberia desse risco mas mesmo assim largou o menino sozinho. O sistema criminal brasileiro falha ao abrir brechas e privilegiar classes. Não é qualquer patroa, é a esposa de um prefeito que pode pagar R$ 20 mil de fiança. A senhora Sarí de nome nobre e brasão não fez mais que sua obrigação de pedir desculpas públicas. Carta cruel e de mal gosto, típico de quem se sente impune da Justiça humana.

Mãe Beth de Oxum escreveu uma grande verdade em seu perfil do Instagram. Se o assassinato a sangue frio de George Floyd não tivesse repercutido tanto, as mortes de João Pedro e Miguel entrariam na vala comum do esquecimento das vidas negras perdidas. E é aí que me pergunto, para quem elas importam a não ser as vítimas e suas famílias?