novas-regras-da-lingua-portuguesaPor Goottembergue Mangueira, professor de Serra Talhada

A interação colocada em prática por meio dos dêiticos – categorias de pessoa, tempo e espaço – o eu, aqui e agora – nos faz trilhar caminhos longos e muitas vezes angustiantes, pois ao produzimos um texto, temos que tomar decisões múltiplas e variadas, e o fazemos de um lugar sócio-histórico e ideológico e aí estamos colocando nosso pensamento para apreciação das outras pessoas que podem concordar ou discordar do que falamos ou escrevemos. Visto que os outros recebem esse texto, também, de um lugar ideológico que pode ser, ou não, antagônico ao nosso. E isso é normal. Sem dialética não existe o debate, o contraditório, o diálogo.

Para sustentar um argumento (quando o texto tiver essa sequência) firme, lógico e sem os vícios da contradição e da repetição é necessário empreender uma incessante peregrinação pelo o universo das palavras, perder o medo da página em branco (ou a tela do computador), de falar, e correr atrás das metáforas, e segundo Schneuwly, mobilizar modelos discursivos dominar as operações psicolinguísticas e as unidades linguísticas (capacidade linguístico – discursiva). Esse é um percurso nada fácil, até mesmo para os mais experientes.

É claro que nem sempre precisamos de todos esses aparatos linguísticos e discursivos, pois depende muito do que se escreve ou do que se fala, mas é importante conhecê-los e tê-los a nossa disposição. Falar ou escrever não pode ser de qualquer jeito, é preciso que nosso discurso seja bem elaborado, tanto no ponto de vista do texto (coerência, coesão, estrutura e discurso) como no da linguística – competências fundamentais para manutenção da “conversa”.

Escrever é mesmo uma via crúcis (falar nem tanto) Não tem como negar isso. Quando escrevemos sempre “tem” uma pedra no meio do caminho. Superá-la, requer esforço. Há nos textos literários (poemas, contos, romances, cordéis) características e finalidades diferentes, em que requer outro tipo de competência. Nesse caso não basta conhecer a língua padrão – às vezes nem se conhece – é preciso técnica e criatividade. Temos o exemplo clássico de Patativa do Assaré que era semianalfabeto, mas produzia poemas e compunha com extrema competência comunicativa e temática. A norma padrão, ou seja, a da gramática normativa, nem sempre deve ser acionada, se a conhecermos, pois o que vale aí é a intenção do locutor e a situação comunicativa em que se encontra.

Falar ou escrever de acordo com a norma padrão em cenários discursivos em que não haja necessidade de utilizá-la, como em bate-papo nas redes sociais com pessoas da nossa intimidade e em roda de conversas com amigos, é tão “errado” quanto fazer o contrário. Essa é uma preocupação que o usuário da língua deve ter para evitar problemas de comprometimento da comunicação.

As palavras e expressões estão internalizadas na mente das pessoas ou por aí em qualquer outro lugar, mas não é tarefa fácil concatená-las, amarrá-las a uma unidade linguística e construir a partir daí o sentido nos mais diversos contextos de interação e dar vida ao seu texto, estabelecendo a comunicação com a intencionalidade proposta pelo locutor.

Enfim, a construção de um texto traz um leque de segredos que se não forem desvendados, correremos o risco de comprometer a comunicação e nos isolarmos. Escrever e falar adequadamente continua sendo um grande desafio para a maioria da nossa população, ainda mais quando se trata das classes sociais pobres, em que a permanência, e não o acesso, à escola é difícil, em função de uma série de fatores.