Falar consigo mesmo é um problema?  - Foto: Freepik
Falar consigo mesmo é um problema? – Foto: Freepik

Por Folha de Pernambuco

Certa manhã, olhei pela janela da cozinha e anunciei, para a sala vazia: “Há algo errado com aquele esquilo — a cauda dele parece muito agitada”. Em seguida, peguei minha fritadeira, perguntando em voz alta se 10h30 da manhã era muito cedo para comer batatas fritas. “Não é”, eu disse. Novamente, em voz alta.

Eu não costumava falar comigo mesma. Agora faço isso constantemente. Quando perguntei a meus amigos de meia-idade se eles também faziam isso, as confissões vieram em massa. Uma delas disse que, quando envia mensagens de texto para as pessoas, diz a mensagem em voz alta quando está digitando, mesmo em público.

— Acabei de olhar para o meu armário e disse em voz alta: ‘Por favor, Deus, que haja essência de baunilha — afirmou outra.

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As pessoas de meia-idade conversam consigo mesmas o dia todo, todos os dias? E isso é um problema? Consultei alguns especialistas.

Falar consigo mesmo

Não consegui encontrar nenhuma pesquisa sobre “autoconversas” de meia-idade, por isso perguntei a Ethan Kross, professor de psicologia da Universidade de Michigan e autor de “Chatter”, se eu havia deixado passar algum. Ele me disse que não. Falar consigo mesmo na meia-idade é um “fenômeno pouco estudado”, explicou ele, acrescentando que é bastante comum.

Quando as pessoas conversam em suas próprias cabeças, isso é conhecido como “fala interior”. Quando o fazem em voz alta, isso é chamado de discurso privado ou conversa interna externa.

Estudos sugerem que a fala interior atinge seu pico na primeira infância, disse Charles Fernyhough, professor de psicologia da Universidade de Durham, na Inglaterra, e autor de “The Voices Within”. No entanto, na meia-idade, muitos de nós retomam o hábito, disse ele.

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Fernyhough me disse que ele diz coisas em voz alta com frequência. Meus filhos dizem: “Pai, o que você está fazendo?”, acrescentou. “E eu digo: ‘Não me importo. Eu estudo essas coisas’”.

À medida que você envelhece, as pressões sociais não o incomodam tanto, adicionou, quer elas envolvam falar sozinho ou dançar “como um idiota” no casamento de um amigo.

Isso não é apenas normal, é útil

Falar com nós mesmos tem várias finalidades, segundo Fernyhough. Pode acalmar a ansiedade e aumentar a motivação. Pode animar, ajudar no planejamento ou fazer com que uma sala vazia pareça mais amigável, acrescentou.

Expressar seus pensamentos pode ajudá-lo a resolver problemas ou ensaiar conversas potencialmente complicadas, disse Kross. Se estiver praticando um discurso difícil em um local público, ele sugeriu, coloque alguns fones de ouvido para que pareça que você está ao telefone.

Falar em voz alta também ativa o que é conhecido como sistema de memória de trabalho verbal, de acordo com Kross, o que pode ajudar a manter coisas como listas de compras ou horários em sua mente por um pouco mais de tempo.

E se estiver procurando algo — por exemplo, em um supermercado — a pesquisa sugere que dizer o nome do item em voz alta pode ajudar a encontrá-lo mais rapidamente.

Quando é demais?
No entanto, há momentos em que uma conversa unidirecional talvez possa levantar dúvidas sobre a saúde mental de uma pessoa, declarou Kross — quando ela viola as normas sociais por ser muito perturbadora ou distrair os outros.

Também pode ser prejudicial se for consistentemente negativa, disse Rachel Goldsmith Turow, psicóloga da Universidade de Seattle e autora de “The Self-Talk Workout”. A autocrítica persistente pode exacerbar condições como a ansiedade, informou. — É como o cigarro da saúde mental — acrescentou. — Isso piora tudo.

Mas dizer “Olha só essas bananas!” para absolutamente ninguém no supermercado não é motivo para alarme, esclareceu Kross.

Se houverem “17 outras coisas peculiares que acompanham esse comportamento, então poderíamos ter uma conversa diferente”, apontou o especialista. Mas, caso contrário, “se estiver funcionando para você, continue fazendo isso”, sugeriu.