A luta da serra-talhadense que venceu preconceitos e fez históriaPublicado às 05h57 deste sábado (26)

Há mulheres que o foco se resume à responsabilidade de cuidar dos filhos, que se concentram no trabalho para encontrar forças, e em Deus para não desistirem. Dona Francisca é uma dessas pessoas. Hoje, a filha dela, Iara Maria Gomes de Farias, com 54 anos, lembra bem de tudo o que a mãe passou e superou para criar a família.

Após a morte de Luiz Gomes, esposo de Dona Francisca, mãe e filhos ficaram morando na terra que o pai havia ganhado de presente do irmão. Alí, começou a jornada da família, a mãe viúva e os filhos órfãos de pai.

Francisca Generosa de Farias, hoje com 79 anos, avó de sete netos e cinco bisnetos, nascida na Cacimba de Baixo próximo a Serra Talhada, já morou em Tacaratu, no Sertão, onde viveu até os 11 anos de idade. Também morou em Caititu, depois em Lagoa do Arroz. De Tacaratu trouxe a vontade de fazer redes no tear. Casou-se aos 23 anos com o senhor Luiz Gomes de Farias, agricultor, descendente de índio, que morreu de  infarto fulminante aos 47 anos; e aos 32 anos Dona Francisca ficou viúva e com quatro filhos para criar, sendo dois meninos e uma menina, e grávida da caçula. Também terminou de criar um irmão que ficou órfão de pai e mãe. 

Não fosse pela garra e determinação que sempre teve na vida, Dona Francisca teria ficado sem saber o que fazer da vida após a morte do esposo, e passou a fazer do seu tear o apoio. Desde muito jovem, ela já trabalhava na agricultura para ajudar no sustento da família. Naquela época, as pessoas, além de plantarem milho e feijão, também plantavam algodão como fonte de renda. Para comprar a máquina de tear, ela trabalhou plantando e catando algodão em outras roças para juntar o dinheiro, pois na época o tear não era barato. Após a conquista aos 18 anos, nunca abandonou a terra, pois dela saía o algodão que se transformava nos fios que teciam as redes e os lençóis que vendia. 

Quando surgiu o fio de fábrica, o sonho era ter a condição de comprar, mas não era barato, e muito menos fácil. O preço e o transporte ainda eram um desafio na época. Aos 25 anos, já casada, e mãe, comemorou a compra do primeiro saco de fio. Uma alegria que ainda hoje conta com orgulho quando lhe vem à lembrança. Ela tecia as redes e o esposo, o senhor Luiz Gomes, único na vida dela, vendia na feira de Serra Talhada, que naquele tempo tomava as ruas da cidade todas as segundas-feiras. 

TESTEMUNHO DA FILHA

“As pessoas perguntavam se ela ficou viúva tão nova, porque não casou. Ela dizia para todo mundo que o tear era o marido dela, porque era dali que ela tirava o sustento, fazia a feira para criar a gente, nós cinco. Porque a agricultura só dá por época e a gente se alimentava todos os dias. Minha mãe sempre acolheu as irmãs, quem precisasse dela, ela acolhia. As irmãs dela têm ela como uma mãe, porque depois que a mãe delas morreu, ela ficou como se fosse mãe das outras, tudo que que precisavam, de um acolhimento, de um conselho, procuravam ela. Todas elas têm muito carinho por minha mãe. Eu tenho o maior orgulho de minha mãe. Sempre digo que a minha mãe não é só mãe, ela foi mãe e pai, nós perdemos o nosso pai muito cedo. No dia dos pais sempre dou parabéns para ela, porque ela foi meu pai e minha mãe, ela foi e é meu tudo”, disse Iara Maria.

Aos 60 anos de idade Dona Francisca teve que parar com o tear devido a uma cirurgia de vesícula que teve que fazer, e para preencher a falta do trabalho, passou a comprar redes e lençóis prontos para vender, mas do mesmo material que ela tecia. Por duas vezes teve Covid-19, após tomar a terceira dose da vacina. Há um ano e sete meses está com Alzheimer, e seus filhos,  Iara Maria, Irapuan Gomes, Germano César, Luiza Maria, José Pereira (conhecido por Dedé, que Dona Francisca criou), e seus netos, bisnetos e sobrinhos que com amor e carinho cuidam da mãe que tanto lutou para dar o sustento, educação escolar e muito amor. 

“Tudo que minha mãe conquistou foi esforço dela, em ajudar os filhos, comprar essa casa que a gente mora hoje, que não é a primeira casa, ela comprou uma quando viemos estudar. Depois ela comprou esta casa que nós moramos aqui no AABB, que ela tem o maior orgulho de ter comprado essa casa enorme. Ela sempre sonhou com uma casa grande, e outras coisas que ela conseguiu foi com o esforço dela. A minha mãe sempre foi uma guerreira”, relatou Iara Maria.

A luta da serra-talhadense que venceu preconceitos e fez história