A morte silenciosa da praça Sérgio Magalhães, em Serra Talhada

Fotos: Farol-Paulo César Gomes

Por Paulo César Gomes, Professor, historiador e colunista do Farol

No último domingo a noite me bateu uma nostalgia em andar pela praça Sérgio Magalhães, em meio a um silêncio sepulcral me deparei revivendo momentos marcantes da minhas infância e adolescência. Recordei-me do barulho dos alto falantes dos parques de diversões Lima, do aroma sedutor das ‘maças do amor’ e dos gritos amedrontadores de monga, a mulher que se transformava em uma primata. Ali bem no começo da praça ficava o restaurante de seu Morumbi, e de um lado o Brazão e do outro o Ki-lanchão.

A cada um passo ao longo da praça me vinha uma lembrança à cabeça. A banca de revista de ‘Toin de Bia’ e da barraca do Vaqueiro, de Nando Rufino. Das conversas intermináveis e das apostas na bandeira 2, ponto mais tradicional dos taxistas da cidade e dos ‘analistas políticos’.

Em um passe de mágica e de alta tecnologia a minha mente reconstruiu em 3D, o antigo coreto. O coreto onde brinquei carnaval quando criança, de onde escutei vários discursos, e de onde também proferi acaloradas palavras contra as elites políticas de Serra Talhada. Eram tempos de omissão, descaso, uso da máquina e do ‘voto de cabresto’. Parte da minha geração não aceitava aquela situação, que de alguma forma ainda perdura em nossa terra.

Os principais fatos de Serra Talhada e região no Farol de Notícias pelo Instagram (clique aqui)

Ao olhar para o piso, senti falta de andar em meio as belíssimas pedras portuguesas, uma verdadeira obra de arte, que nos remetia ao calçadão de Copacabana, no Rio de Janeiro. Logo adiante me deparei com o espaço onde existia o ‘banco da diva’, que para os meus contemporâneos foi usado para se divertir, e não para fofocar, como em gerações anteriores. E logo à esquerda, em meio a um ambiente sombrio estava a Casa da Cultura, sem brilho, sem história, sem vida. Mas as lembranças boas se sobrepõem as ruins, e por alguns minutos sorri. Sorri por ter conhecido a barraca de Dona Maria, onde degustava do seu saboroso pastel, e era de lá que ficava esperando o início das festas do CIST. Tempos bons! Tempos inesquecíveis!

Como sempre fiz aos domingos, contornei a praça, dando de cara com o Bar de Seu Carlos e de bons momentos vividos ali, e do outro lado estava o BNB e sua calçada emblemática, hoje protegida por um grande ferro. Local que por vários anos foi o ‘point’ dos boyzinhos e boyzinhas da cidade, lá tudo era permitido. Ao contrário do coreto, onde para os ricos da cidade, só quem frequentava era a ralé que curtia ‘uma parada’, ‘uma bola’, uma cachacinha…

Encerrei o meu passeio silencioso bem em frente onde dei (ou recebi) o meio primeiro beijo da minha esposa Michelly, e olha que já se passaram 24 anos! Pena que o banco onde essa união de almas aconteceu foi demolido.

A morte silenciosa da praça Sérgio Magalhães, em Serra Talhada

O QUE FIZERAM COM A PRAÇA?

Entre destruição e reconstrução/requalificação, alegrias e tristezas, restou-me uma grande dúvida. O que levou ‘a morte silenciosa da praça Sérgio Magalhães’? Lógico que imaginei que foi a chegada da modernidade, do processo de destruição dos antigos casarões residenciais e que logo deram lugar aos pontos comerciais.

Porém, não poderiam esquecer que segundo setores da sociedade, a culpa é das pessoas em situação de rua. Segundo esses, eles bebem, usam drogas, brigam, fazem sexo ao ar livre. Mas será que isso já não existia na praça há décadas?! Não fumo e não bebo. Mas conheço um monte de gente de todas as classes sociais que ‘fumaram’ e ‘cheiraram’ em plena praça. Conheci vários arruaceiros, bagunceiros, brigões que acabavam com as festas na praça, e todos fechavam os olhos para isso, inclusive eu, porque eram amigos ou eram de famílias tradicionais.

E OS PISTOLEIROS?

Quantos pistoleiros trocaram tiros ao longo de décadas, repito, décadas, no meio da praça. Quantas pessoas foram assassinadas na praça Sérgio Magalhães e na Concha Acústica, muitos deles nunca foram condenados. Andar armado ou ao lado de um pistoleiro, representava um status social. Mas, apesar do cenário de faroeste a praça Sérgio Magalhães nunca, nunca deixou de ser frequentada pela população. Os serra-talhadenses sempre sentiram orgulho da sua principal praça, do nosso cartão postal.

MAIS PONTES

Precisamos construir pontes e não muros, como bem disse o saudoso Papa Francisco. Se querem tirar as pessoas em situação de rua da praça, então devolvam ao povo o lazer, a cultura e o entretenimento. Realizem festivais de música, de poesia, de desenho e pintura. Concurso de danças de rua. Apresentações de grandes seresteiros e forrozeiros, até de bandas de Rock in Roll. Ergam quiosques na praça para incentivar o empreendedorismo, priorizando os artesãos e artesãs e os ambulantes. Construam um banheiro público e uma ciclovia no entorno da praça, assim como, um espaço de lazer para as crianças.

Depois de andar e pensar em tantas coisas resolvi dormir o sono dos justos, pois como um serra-talhadense apaixonado por esse torrão e que só desejo o bem aos meus conterrâneos e aos visitantes, não posso assistir as cenas e ficar calado, inerte ao descaso.

Como brinde, deixo aqui alguns registros fotográficos feitos no último domingo, dia 03, às 21h.

A morte silenciosa da praça Sérgio Magalhães, em Serra Talhada