PTQuando o PT entra no seu 12o ano de governo, um grupo que costumava militar ao seu lado começa a sentir que tem sido colocado cada vez mais para escanteio. Parte dos militantes da esquerda brasileira estão se distanciando do petismo, mas também sentem-se órfãos por não terem em quem se sustentar no atual cenário político, onde as maiorias dos partidos são de centro ou de uma esquerda radical que quase não tem ressonância na sociedade.

O PT, que nesta segunda-feira comemora 34 anos, nasceu em meio a um momento de confrontação com o regime militar. Agora, mudou seu espectro. Para cientistas políticos e sociólogos, o partido fundado por operários, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e intelectuais, como o historiador Sérgio Buarque de Hollanda, hoje milita na centro-esquerda.

“É o mesmo movimento pelo qual passaram os partidos de esquerda da Europa. Depois de ficarem no poder por um tempo acabaram migrando para o centro, só que no Brasil demorou um pouco mais”, afirmou o cientista político Carlos Ranulfo, professor na Universidade Federal de Minas Gerais e coautor do livro “A Democracia Brasileira – Balanço e perspectiva para o século 21”.

Essa migração forçou uma transmutação dos movimentos sociais que sempre acompanharam os petistas nas urnas e nas ruas. Os sindicalistas que eram fortemente representados na esquerdista e oposicionista Central Única dos Trabalhadores (CUT) se dividiram e se difundiram para vários outros grupos como a Força Sindical e a Central Geral dos Trabalhadores do Brasil.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) claramente se distanciaram do governo Dilma Rousseff. Apesar de estar insatisfeito com os rumos das gestões petista, o MST é mais discreto, não reclama tanto e faz algumas invasões de terra. Enquanto que os sem-teto tecem críticas públicas ao governo federal. Em São Paulo, os sem-teto retomaram com intensidade as invasões de imóveis abandonados, aumentaram seus protestos e até ameaçam invadir operadoras de telefonia.

“Há quem acredite que o PT se transformou naquilo que ele criticava. Seria uma nova forma do neoliberalismo. Além disso, ele conseguiu calar quem seriam seus críticos. A CUT é um caso paradigmático, de movimento de luta que se transformou em apoiador do governo. Foi cooptada”, afirmou o cientista político argentino Gonzalo Rojas, que vive há 14 anos no Brasil e leciona na Universidade Federal de Campina Grande.

Apesar dessa mutação, há estudiosos que ainda enxergam algumas características esquerdistas no PT. “Ele abriu mão do projeto de transformação social que tinha originalmente e, sendo assim, caminhou para a direita. No entanto, em contraste com os principais grupos da oposição, o PT ainda mantém algum grau de preocupação social, mesmo que limitada a políticas compensatórias”, analisou o doutor em sociologia Luis Felipe Miguel, professor da Universidade de Brasília (UnB) e autor do recém lançado livro “Democracia e Representação”.

Manter-se completamente na esquerda após três governos seguidos é algo extremamente difícil, diz Ranulfo. “Uma coisa é fazer oposição. A outra é governar.”

( Jornal El País- Espanha)