Pico da dengue costuma acontecer entre os meses de abril e maio – Foto: Canva

Por Metrópoles

O Brasil enfrenta, neste início de 2024, um aumento acelerado de casos de dengue. A doença se espalhou por todos os cantos do país e atinge pacientes de todas as idades, dos mais jovens aos mais velhos. No caso das crianças, algumas vezes o mal pode ser assintomático no início, o que leva ao questionamento a respeito dos efeitos imediatos, durante a ação do vírus, e das sequelas que ele pode deixar.

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A pediatra, pneumologista pediátrica e professora no Curso de Medicina no Centro Universitário do Planalto Central Apparecido dos Santos (UNICEPLAC), Letícia Oliveira Dias, explicou que a dengue, em crianças, normalmente, é assintomática ou leve no início ou aparece como um febre viral, o que leva muitos pais a pensarem que trata-se de uma virose qualquer e não procuram o tratamento imediato. Isso faz com que o quadro evolua para algo mais grave, o que pode, então, ser interpretado pela família como os primeiros sintomas da doença.

“As complicações podem acometer diversos sistemas do organismo: no aparelho cardíaco pode ocorrer miocardite e insuficiência cardíaca; já no sistema respiratório esse paciente pode evoluir com edema agudo de pulmão, derrame pleural e até insuficiência respiratória; no sistema neurológico há ocorrência de psicose, paralisia, neuropatias, meningite e encefalite; ocorrem também complicações hematológicas como vasculopatias, coagulação intravascular disseminada”, explica a profissional.

Ela alerta, ainda, para riscos de problemas em dois órgãos fundamentais: fígado e rins. “É importante citar as complicações em dois órgãos, o fígado que pode complicar com hepatite e insuficiência hepática, e os rins, que podem evoluir com insuficiência renal. As sequelas decorrem dessas complicações, com uma disfunção cardíaca, alteração neurológica permanente e doença renal crônica”, explica a pediatra.

Letícia Oliveira Dias comentou que a dengue pode gerar “duas síndromes importantes que podem afetar tanto crianças como adultos, como a Síndrome de Guillain-Barré (SGB) e a Síndrome de Reye”, a primeira ocorre quando “o sistema imunológico do paciente reconhece o seu próprio sistema nervoso como um invasor e promove sua destruição” e a segunda “ocorre, geralmente, após algumas infecções virais, como a dengue, e o uso de algumas medicações como a aspirina, um dos motivos, inclusive, que é desaconselhável o uso de aspirina na vigência da dengue”.

Ambas podem ser reversíveis se o tratamento foi iniciado no início da manifestação, mais um motivo pelo qual é recomendado a assistência médica nos primeiros sintomas da dengue.

Faixa etária

A médica também explicou alguns dos motivos que levaram o Sistema Único de Saúde (SUS) a iniciar a vacinação pela faixa etária de 10-14 anos. “Primeiramente, que a partir dos anos 2000, a prevalência da dengue, que antes era maior em adultos jovens e com raros registros de casos graves, apresentou um deslocamento na faixa etária de acometidos, com pelo menos 25% de indivíduos notificados e hospitalizados apresentando menos de 15 anos de idade, segundo o Ministério da Saúde”, disse ela.

Outro motivo, conforme a especialista, é que o principal fator de risco para o desenvolvimento da doença grave é a segunda infecção. “Nos locais com maior incidência de casos de dengue, pressupõe-se que essas crianças e adolescentes já que foram expostos à primeira infecção nos primeiros anos da infância. Além disso, a vacina QDenga, da farmacêutica japonesa Takeda Pharmaceuticals, demonstrou melhor eficácia nessa faixa etária. Por fim, o outro grupo de risco, os idosos, ainda não foi contemplado, porque a farmacêutica ainda não concluiu os estudos de segurança e eficácia nessa faixa etária”, acrescenta.

Sequelas

Juliely Saraiva, de 35 anos, relatou que sua filha, Isabela Saraiva, na época com 9 meses, teve dengue, porém o único sintoma apresentado foi um episódio de febre repetido, que a fez levá-la ao Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Chegando ao hospital, Isabela começou a vomitar, com alta sonolência e teve uma série de convulsões. A criança foi internada assim que o atendimento médico foi feito.

Após uma série de exames, descobriram que Isabela estava com dengue, mas como os sintomas não diminuíam, os médicos continuaram a averiguar, até descobrirem que a criança tinha desenvolvido encefalite, inflamação cerebral causada por um vírus, no caso, pelo vírus da dengue. A encefalite colocou a menina em coma por 4 dias.

A pediatra Letícia Oliveira, explicou que “as manifestações neurológicas tem incidência entre 0,5 a 20% dos casos de dengue e podem ser explicadas por duas possibilidades: pela inflamação causada pelos anticorpos contra o vírus da dengue no sistema nervoso central e também pela própria presença do vírus no líquor (fluido presente no cérebro e na medula espinhal)”.

Como consequência da encefalite, depois da alta, Isabela Saraiva teve um retardo no desenvolvimento e apresentou paralisia cerebral leve que a faz mancar com uma das pernas. Hoje com 1 ano e 7 meses, a criança segue com os acompanhamentos fisioterápicos e médicos no Hospital Sarah para contornar as sequelas deixadas pela infecção.

“Eu sou uma defensora do cuidado e do uso do repelente, dengue é uma doença séria, eu quase perdi minha filha”, reforçou Juliely Saraiva.