Publicado às 05h34 deste sábado (28)

Por João Luckwu, PRF aposentado, advogado e poeta serra-talhadense

Numa clara situação de desespero, o até então presidente Jair Messias Bolsonaro enviou ao Senado o tão prometido pedido de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. A inusitada acusação de cometimento de crime de responsabilidade se ampara, segundo o presidente, no fato de que “o ministro Alexandre de Moraes atuou como verdadeiro sensor da liberdade de expressão ao interditar do debate de ideia e o respeito à diversidade.”

Dentre outras alegações, o presidente Bolsonaro, em seus devaneios, também afirma que o ministro citado praticou condutas que atentam contra o modelo constitucional brasileiro e, consequentemente, ultrajam o Estado Democrático de Direito, o devido processo legal e os direitos às garantias fundamentais. Importa destacar que a liberdade de expressão não é absoluta, ocorrendo o abuso do direito, este se transforma em ato ilícito, passível de responsabilidade por parte do agente infrator.

Conforme estabelece o artigo 52 da Constituição Federal de 1988, em seu inciso II, cabe ao Senado Federal: processar e julgar os ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade.”

Neste diapasão, os crimes de responsabilidade, bem como os processos de julgamento, são regulados pela Lei 1.079, de 10 de abril de 1950. Vejamos o que diz em seu artigo segundo “in verbis”:
Art. 2° – Os crimes definidos nesta lei, ainda quando simplesmente tentados, são passíveis da pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, imposta pelo Senado Federal nos processos contra o Presidente da República ou Ministros de Estado, contra os ministros do Supremo Tribunal Federal ou contra o Procurador Geral da República.

O artigo 39 da citada lei, descreve taxativamente quais são os crimes de responsabilidade dos ministros do Supremo Tribunal Federal, vejamos:

1 – Alterar, por qualquer forma, exceto por via de recurso, a decisão ou voto já proferido em sessão do Tribunal;
2 – Proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa;
3 – Exercer atividade político-partidária;
4 – Ser patentemente desidioso no cumprimento dos deveres do cargo;
5 – Proceder de modo incompatível com a honra dignidade e decoro de suas funções.

O presidente Jair Bolsonaro alega em seu pedido que o ministro Alexandre de Moraes “impulsiona os feitos inquisitoriais com parcialidade, direcionamento, viés antidemocrático e partidário, sendo, ao mesmo tempo, investigador, acusador e julgador.”

Observa-se, portanto, que inexiste uma fundamentação jurídica que respalde tal pedido, uma vez que decisões judiciais são ancoradas no princípio do livre convencimento motivado dos magistrados, não sendo, portanto, o pedido de impeachment, o remédio jurídico adequado para a situação, exceto naquelas que tenham sido viciadas por atos de corrupção.

Um pedido de impeachment não pode servir como mero instrumento de destempero e ser banalizado como um simples discurso no “cercadinho”. Para ser suscitado tal instrumento, carece de uma grave violação aos preceitos legais, conforme estabelece o ordenamento pátrio. Como já era esperado, o pedido de impeachment foi rejeitado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), por falta de pressupostos legais, consoante parecer do Advogado Geral do Senado, Octavio Orzari, que recomendou a rejeição do pedido por “manifesta ausência de tipicidade e de justa causa.”

Nas palavras do Presidente do Senado Federal, “a rejeição do pedido é fundamental para a democracia e a separação de Poderes e a necessidade de que esta independência de cada um dos Poderes seja garantida e que haja convivência mais harmoniosa possível.”

Fica a impressão de que o referido pedido de impeachment tenha sido feito à revelia da assessoria jurídica do Palácio do Planalto, tornando-se evidente que o objetivo do presidente, compreendido por alguns especialistas políticos como birra, é tão somente sustentar seus ataques contra o Poder Judiciário, incitando sua base de apoio na esdrúxula tentativa de uma ruptura institucional. Típica situação de desespero de quem já percebe que o seu período como comandante da nação está com os dias contados.