Do Leia Já

Celebrado em 8 de março, o Dia Internacional da Mulher não é um momento para dar flores, maquiagens ou produtos de beleza. Por trás da oportunidade capitalista, a data rememora, todos os anos, séculos de luta por igualdade de gênero, levando em consideração, sobretudo, melhorias e adequações nas condições de trabalho.

No Brasil, a história mais aceita para a comemoração do dia 8 de março é em virtude de um incêndio provocado em uma fábrica têxtil em Nova York, nos Estados Unidos. Entretanto, o próprio levantamento sobre o sinistro é confuso historicamente. A primeira versão traz que o fogo foi ocasionado em 1911; 125 mulheres e 21 homens morreram carbonizados enquanto trabalhavam. As precárias condições do lugar ocasionaram uma rápida propagação das chamas, impossibilitando a fuga dos atingidos.

Já a outra versão do incêndio aponta provocação policial, após mulheres entrarem em greve pedindo melhorias nas condições de salários e diminuição da carga horária, já que as trabalhadoras chegavam a ficar por 14 horas em produção, de segunda-feira a sábado, na Triangle Shirtwaist. Os grevistas foram trancados em um galpão e em seguida incendiados vivos.

Apesar disso, outros momentos de luta e greves de mulheres em fábricas também apontam para o processo de escolha da data. De acordo com o calendário Juliano adotado antigamente pela Rússia, em 23 de fevereiro de 1917 – 8 de março segundo o calendário gregoriano -, operárias russas paralisaram os trabalhos para pedir melhores condições de trabalho e protestar contra a fome, instaurada no país em decorrência da Primeira Guerra Mundial.

Oficialização

Após décadas de luta, o dia 8 de março só chegou a ser oficializado Dia Internacional da Mulher pela Organização das Nações Unidas em 1975. Segundo a professora e pesquisadora Danielle Camelo, é importante que a data seja lembrada como forma de força. “O importante é pensarmos nessa data como símbolo de luta dos movimentos femininos e feministas, ao invés da romantização. Há muito desse pensamento, que nós, mulheres, nascemos com herança para sermos mães, frágeis, delicadas, etc.”, explica a docente.

De acordo com a pesquisadora, a luta pela igualdade de gênero vem à tona desde o século 17. “Há muito tempo que as mulheres vêm lutando por melhores condições dentro da sociedade. O feminismo surgiu desde o século 17, sendo um movimento de mulheres para mulheres e em prol dos direitos de trabalho, salários, etc.”, destaca a professora.

Brasil

Danielle Camelo também aponta para as lutas de mulheres no Brasil. “Em Pernambuco, em 1646, durante a expulsão dos holandeses, 600 deles saíram da Ilha de Itamaracá e foram até Tejucupapo em busca de dominar aquela região que era rica em mandioca e caju, para abastecer a tripulação. Eles escolheram um domingo porque sabiam que os homens estariam no Recife e acharam que com a cidade só com mulheres seria mais fácil de dominar. Mas chegando lá, as mulheres lideraram uma revolta e conseguiram vencer o holandeses utilizando armas simples, como água quente e pimenta. Quatro mulheres lideraram essa investida, Maria Camarão, Maria Quitéria, Maria Clara e Joaquina, e elas precisam ser nomeadas na história”, detalha Danielle Camelo.

Nos anos seguintes, os movimentos de mulheres a favor da igualdade entre os gêneros ganharam força e as sufragistas entraram em cena pela participação política feminina. No Brasil, a mulher conquistou o direito ao voto apenas em 1932, durante o governo de Getúlio Vargas.

Progressão

Apesar das conquistas, ainda há a necessidade de alcançar patamares maiores de igualdade de gênero. A docente Danielle Camelo salienta que nomes de luta, revolução e protagonistas femininas precisam ganhar mais visibilidade. “Os nomes das mulheres que fizeram história são apagados por quem conta o processo de desenvolvimento da sociedade. Entretanto, recentemente vemos um salto no reconhecimento de figuras femininas”, salienta.

Segundo a professora, ainda há muito o que ser conquistado pelas mulheres. “As mulheres passaram a ter, sim, grande participação na história, mas ainda há muita coisa a ser alcançada. As mulheres ainda precisam dizer que o corpo é delas e que elas devem controlá-lo. Ainda precisam lutar pela liberdade sexual”, ressalta.

Feminismo

Muito polêmico, o feminismo é um conceito geralmente incompreendido para quem não é impactado ou é condescendente com a estrutura patriarcal do mundo. Se por um lado há quem ache que ser feminista está em andar sem sutiã e não se depilar, por outro, há quem entenda a importância de atitudes como essas para promover a igualdade de gênero, respeito e sororidade.

O feminismo não é uma onda de pensamento recente, tendo surgimento em 1791, com a resposta da dramaturga Olympe de Gouges para Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, na França. A Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã pedia o direito a voto, à propriedade e ao acesso às instituições políticas. Olympe foi guilhotinada dois anos depois, por ter “traído a natureza de seu gênero”.

Até hoje, movimentos liderados por mulheres ganham força e voz ao redor do mundo. O mais popular no Brasil é a Marcha das Vadias, que é realizado em todo território nacional. A origem da passeata é do Canadá, na Universidade de York, após um policial sugerir que as mulheres evitassem se vestir como vadias para não serem vítimas de crimes sexuais. A indicação sugeria que, de alguma forma, a mulher poderia ser a culpada pelo assédio ou estupro.

Por ser um movimento plural, o feminismo ganha diversas vertentes ao longo dos anos. “Existe o movimento das feministas negras, que trazem duas mazelas da sociedade, que é a questão de gênero e de etnia, o racismo. Há as feministas liberais, que indicam a participação de homens na luta; como também existem as feministas mais radicais, que não permitem a inclusão de homens e alegam ser uma luta apenas de mulheres para mulheres. Esses são alguns dos embates no feminismo, mas é algo natural por ser uma luta pluralizada. O que pode ser feito é o diálogo entre os grupos dos movimentos”, comenta Danielle.