Revista Forum

O ex-servidor do Tribunal Regional do Trabalho da 18º Região, de Goiás, Esdras Emmanuel Sousa Góes, deu entrada na ouvidoria do Ministério Público Federal em uma manifestação contra o procurador Ailton Benedito de Souza, atual chefe da Secretaria de Direitos Humanos da PGR, por tortura e sequestro.

Góes afirma que sofreu perseguições em Goiás por denunciar um esquema de corrupção no interior do tribunal e que essas investidas aconteceram com a chancela de Benedito, então comandante do MPF em Goiás.

No texto ele afirma o seguinte:

“O procurador da República Ailton Benedito […] participou do meu sequestro e tortura juntamente com alguns juízes […], com procuradores da república […] envolvidos no caso de Corrupção na Justiça do Trabalho de Goiás e com diversos delegados federais e policiais federais. O motivo foi que eu denunciei, com mais de 50 gravações e outros documentos comprobatórios, práticas de corrupção”.

O conteúdo do documento, que consta com “atendimento finalizado” na ouvidoria, também foi divulgado nas redes sociais do ex-servidor, em especial no canal de YouTube EESG. Assista ao vídeo sobre Ailton Benedito ao final da matéria.

Conservador e entusiasta a ditadura militar, Benedito foi nomeado para o posto na PGR pelo procurador-geral da República escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro, Augusto Aras. Antes da indicação ele já era famoso entre apoiadores do ex-capitão e chegou a ser indicado pelo governo para compor a Comissão Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, mas foi vetado pelo MP.

Em entrevista à Fórum, Esdras Góes fez uma retrospectiva do caso, contando que sofreu assédio moral desde que chegou ao TRT de Goiás e, por conta de denúncias de esquemas de corrupção, perdeu seu cargo e chegou a ser preso preventivamente por supostos crimes que, segundo ele, não deveriam acarretar em encarceramento – calúnia e difamação.

O começo

O ex-servidor conta que sofreu assédio moral desde que assumiu seu cargo em Goiás, em 2012. Ele relatou que foi pressionado a trocar seu posto com alguém de São Paulo – onde trabalhava antes – e que, inclusive, chegou a ser apresentado a uma lista de nomes de pessoas que deveriam ir para o tribunal. A listagem continha parentes de diversos servidores, incluindo desembargadores.

“Você não tem parente aqui, por que você não vai embora?” era uma das frases ouvidas com frequência por ele. Góes, que é da Bahia, conta que largou o posto em São Paulo porque entendia que Goiás tinha o custo de vida mais acessível e algumas vantagens administrativas que permitiram mais flexibilidade para seus estudos.

Processo administrativo

Após tentar driblar as investidas, Góes viu um processo administrativo ser aberto contra ele em menos de um ano atuando no estado . “Era uma intimidação para fazer a permuta, com alegações de problemas psicológicos”, relatou.

A partir daí, ele passou a gravar algumas conversas que tentavam confrontá-lo. Ele afirma que o objetivo do assédio era o mesmo, trazer parentes para o tribunal e favorecer o que ele chama de “política do Café com Leite”, que fazia a direção da instituição colocar em cargos comissionados pessoas próximas de acordo com o procurador da vez.

A psicóloga

Na trama, aparece como uma das figuras centrais a psicóloga Marina Junqueira Cançado, que fez uma consulta com Góes e, sem ele saber, fez o servidor passar por um teste criminológico – Teste de Rorschach. Segundo Góes, a funcionária – que foi gravada por ele – tentou fraudar o teste, estimulando respostas diferentes das ditas por ele.

Góes alega que não havia necessidade de um novo laudo psicológico, tendo em vista que ele havia realizado um logo quando foi admitido, em São Paulo. Mesmo assim, a psicóloga deu seu diagnóstico: problema psicológico de longa duração.

O servidor decidiu não recorrer da avaliação e conta que o assédio moral se intensificou nos meses seguintes. “Me mudavam de setor a cada três meses, em uma especie de assédio moral gerencial”, afirmou.

Em meio a isso, surgiu um novo laudo de Cançado, cerca de 10 meses após a consulta alegando que o servidor tinha a estrutura psíquica afetada e “indícios de psicopatia”. Após o parecer, a psicóloga convocou Góes para junta médica. Como ele não compareceu, levou 15 dias de suspensão.

O servidor voltou a ser convocado para uma junta médica e foi a partir disso que ele decidiu denunciar que o laudo era falso. Com a ameaça, a funcionária voltou atrás e disse que Góes não possuía transtorno algum.

Com o novo parecer e com diversas gravações em mãos, o ex-servidor fez uma denúncia ao Ministério Público Federal, mas foi arquivada. Com isso, Esdras decidiu compartilhar o material que ele possuía nas redes sociais. Os áudios passaram a ser divulgados no YouTube e na página de Facebook “Corrupção na Justiça do Trabalho” enquanto ele fazia novas denúncias ao MP – todas arquivadas.

A Fórum entrou em contato com o TRT-GO e ligou para um número que está atrelado à psicóloga Marina Junqueira Cançado em busca de um posicionamento da profissional, mas ainda não conseguiu resposta. Este espaço está aberto para esclarecimentos.

Outro lado

Em resposta a Fórum, o TRT desmentiu as acusações. Segundo o TRT, todos os procedimentos adotados contra Esdras seguiram rigorosamente a legislação, com prazo para que o servidor recorresse da expulsão dos seus quadros – o que ele não fez segundo o tribunal.

O tribunal aponta que as atitudes que levaram à demissão do ex-servidor foram desídia (deixar de cumprir suas atribuições), insubordinação (desobediência a ordens de superiores hierárquicos) e ofensas infundadas à honra de magistrados e servidores. Antes de ser demitido ele recebeu 1 advertência e 2 suspensões, mas, segundo o TRT, seguiu com o mesmo comportamento.

Além disso, o TRT alega que as gravações de Esdras são descontextualizadas por ele e que “é importante dizer que, antes da conclusão do processo disciplinar, foi aberto incidente de insanidade para, diante de alguns comportamentos do servidor, avaliar sua saúde mental”.

Ailton Benedito

Um dos processos arquivados foi para as mãos de Ailton Benedito, então chefe do Ministério Público de Goiás.

Foi através de Benedito que também foi iniciado um processo criminal contra o ex-servidor. Ailton acatou denúncia do chefe do então desembargador-presidente do tribunal, Platon Teixeira de Araújo Filho, e repassou a acusação por calúnia, difamação e ameaça a outros procuradores. “Quando acontece um caso desses, em que apontam supostos crimes, o administrador deve oficiar o MPF e quem aceita o ofício é o procurador chefe, que era Ailton Benedito”, relata Góes.

O ex-servidor conta que o processo “não era para processar direitinho, era para embasar ameaça” e que, a partir dele, passou a ser perseguido por policiais e chegou a ser preso preventivamente por crimes que não deveriam passar por prisão.

“Foi sequestro e tortura camuflado por prisão preventiva”, declarou. “Fui ‘preso’ duas vezes, mas em nenhuma das duas vezes ninguém divulgou nada. Por que? Porque sabem que era problema”, questionou.

“Só não fui espancado, mas levei bomba de gás, gás de pimenta, fiquei em uma cela com diversas pessoas… Me colocaram junto de diversos tipos de criminosos, não queriam nem saber se eu tinha ensino superior”, completou.

Ele conta que a primeira prisão aconteceu quando foi verificar o processo no qual era alvo. Esdras relata que foi cercado por policiais federais à paisana e levado em prisão preventiva ilegal, sem mandado. Além disso, oficiais foram até a casa do ex-servidor e levaram celulares, computadores e máquinas fotográficas. Com a apreensão, um dos policiais chegou a apagar a página no Facebook do ex-servidor – que posteriormente foi recriada.

Vida após a morte

A segunda prisão foi mais séria. Ele foi levado para um presídio estadual.

“Chegaram à paisana em minha casa de manhã cedo, arrombando a porta. De lá me levaram uma cela da carceragem da PF em Goiânia e depois para o presídio. Aí começou a ficar mais tenso o negócio”, disse. “Lá em Goiânia é terrível… De imediato eu vi uma pessoa sendo torturada, espancada por três carcereiros”, alegou.

“Quando eu estava sendo levado, eles falaram: ‘fique tranquilo, esse castigo vai ser maior que o anterior, mas já está saindo seu alvará de soltura’”, contou. “Castigar é tortura, está na lei de tortura”, completou. Ele afirma que a ação foi determinada pelo juiz federal Alderico Rocha Santos.

Os policiais ainda teriam feito ameaças indiretas ao ex-servidor, pedindo para ele “ficar quieto” a partir dali, senão alguém poderia matá-lo e fazendo algumas provocações. Um deles chegou a fazer a seguinte pergunta: “Você acredita em vida após a morte?”