Da CNN

As forças de segurança de Mianmar mataram pelo menos 38 pessoas no domingo (14) em um dos dias mais mortíferos desde que as forças armadas tomaram o poder em um golpe militar, e declararam lei marcial em seis áreas depois que fábricas financiadas pela China foram incendiadas.

A maior quantidade de vítimas foi registrada em um subúrbio industrial de Yangon, onde militares e policiais abriram fogo contra manifestantes desarmados, matando pelo menos 22, de acordo com o grupo de defesa Associação de Assistência para Prisioneiros Políticos (AAPP).

Pelo menos 16 pessoas foram mortas em outras regiões do país no domingo, incluindo na segunda maior cidade do país, Mandalay, e em Bago, onde a mídia estatal disse que um policial morreu devido a um ferimento no peito após um confronto com manifestantes – o segundo policial morto nos protestos.

As mortes no fim de semana trazem o número de vítimas desde o golpe de estado subir para pelo menos 126 pessoas, de acordo com a AAPP.

A embaixada chinesa em Mianmar disse que várias fábricas financiadas pela China foram destruídas e incendiadas na zona industrial de Yangon durante os protestos de domingo. Cidadãos chineses também ficaram feridos, de acordo com a embaixada.

Não está claro quem foram os perpetradores e nenhum grupo reivindicou a responsabilidade pelos incêndios.

“A China insta Mianmar a tomar mais medidas eficazes para impedir todos os atos de violência, punir os perpetradores de acordo com a lei e garantir a segurança da vida e da propriedade de empresas e funcionários chineses em Mianmar”, afirmou a emissora chinesa CGTN ao ler comunicado da embaixada.

Manifestantes anti-golpe suspeitam da China, com manifestações frequentes visando a embaixada chinesa em Yangon e manifestantes acusando Pequim de apoiar o golpe e a junta militar.

Embora a China não tenha condenado abertamente a tomada do poder, ela apoiou uma declaração do Conselho de Segurança da ONU dizendo que “condena veementemente a violência contra manifestantes pacíficos” e pediu aos militares que “exerçam o maior controle”.

Em sua declaração no domingo (14), a China pediu aos manifestantes em Mianmar que expressem suas demandas legalmente e não prejudiquem os laços bilaterais com o país.

Após as dezenas de morte, a junta militar impôs a lei marcial em Hlaingthaya, um dos maiores distritos da cidade onde vivem muitos trabalhadores pobres de fábricas, de acordo com o canal de notícias estatal MRTV.

A mídia local informou que a lei marcial também foi declarada no distrito de Shwepyithar, em Yangon. Nesta segunda-feira (15), os militares declararam lei marcial em mais quatro distritos de Yangon de North Dagon, North Okkalapa, South Dagon e Dagon Seikkan – áreas onde a maioria das fábricas da cidade estão localizadas.

A lei marcial sob o regime da junta significa que o comandante militar da região de Yangon recebe “plena autoridade administrativa e judicial” nos distritos onde a lei marcial é declarada, de acordo com a mídia local Myanmar Now.

As redes móveis permanecem “desativadas em todo o país”, apesar da restauração da conectividade à Internet na segunda-feira, após um desligamento pela 29ª noite consecutiva, de acordo com o serviço de monitoramento de internet NetBlocks.

Manifestantes e jornalistas têm contado com seus telefones celulares para transmitir protestos ao vivo e documentar repressões policiais.
‘As pessoas têm o direito de se defender’

Enquanto os protestos continuam em Mianmar, o líder de um grupo de legisladores expulsos pelos militares promete fazer uma “revolução” para derrubar a junta governante.

Falando publicamente pela primeira vez no sábado, Mahn Win Khaing Than, que era presidente da câmara alta do Parlamento antes do golpe, disse em um vídeo no Facebook: “Este é o momento mais sombrio da nação e o momento em que o amanhecer é impedido.”

Mahn Win Khaing Than, junto com outros legisladores depostos do Partido da Liga Nacional para a Democracia (NLD), permanece na clandestinidade.

Com a líder civil Aung San Suu Kyi e o presidente Win Myint sob prisão domiciliar, ex-legisladores formaram um governo civil paralelo – denominado Comitê Representante de Pyidaungsu Hluttaw (CRPH) – que pressiona pelo reconhecimento internacional como governo legítimo.

“Para formar uma democracia federal, que todos os irmãos étnicos, que têm sofrido vários tipos de opressões da ditadura por décadas, realmente desejam, esta revolução é a chance para nós unirmos nossos esforços”, disse Mahn Win Khaing Than.

Ele também afirmou que o governo civil “tentará criar as leis necessárias para que as pessoas tenham o direito de se defender” contra a repressão militar, informou a Reuters.

Os militares consideram o CRPH ilegal e avisaram que qualquer pessoa encontrada cooperando com eles será acusada de traição. O CRPH declarou os militares de Mianmar uma “organização terrorista”.

No domingo, a enviada especial do secretário-geral da ONU em Mianmar, Christine Schraner Burgener, divulgou uma declaração condenando “o contínuo derramamento de sangue no país, já que os militares desafiam os apelos internacionais, inclusive do Conselho de Segurança, por moderação, diálogo e pleno respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais”.

“A Enviada Especial ouviu pessoalmente de contatos em Mianmar relatos comoventes de assassinatos, maus-tratos a manifestantes e tortura de prisioneiros no fim de semana”, disse ela.

Até domingo, 2.156 pessoas foram presas, acusadas ou condenadas em relação ao golpe militar, segundo a AAPP.