saudade1[1]Era final de tarde, na Rua do Cine Plaza, quando o negro Severino Perua passou em frente da minha casa e chamou a atenção de todos. Sem camisa, barrigão exposto e pés descalços, Perua passou por mim e deu uma sonora gargalhada. Quase sempre, andava com uma bacia na cabeça carregando vísceras. Severino da Perua era um trabalhador e tinha um jeito diferente de tocar a vida.

Já o Pedro Cego tinha um humor que tirava qualquer um do circuito. Certa feita, na esquina da Rua Enock Ignácio com a Padre Ferraz, Pedro caminhava lentamente guiado por uma bastão, quando alguém gritou: “Olha o buraco, Pedro”. A resposta foi na bucha: “Se aperrei não, meu filho, já estou com o pau dentro”. E todos vibraram com a astúcia do Pedro, que exalava bom humor mesmo sem enxergar as cores do mundo.

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Neste rol de ‘heróis’ populares, tenho na memória a imagem do Lucas Doido, o senhor dos anéis. Andava sujo, barba eternamente por fazer, os dedos cheios de anéis, mas tinha uma fascinação por futebol. Era impressionante. Já no Beco de Cazé, em frente ao Banco Bradesco, meu programa das segundas-feiras era ver o show de Bento, um bom homem que tinha como hábito cantar a música ‘O Ébrio’ de Vicente Celestino. Sem dentes, careca e desafinado, Bento disparava: “Tornei-me um ébrio e na bebida busco esquecer… ao lado, fazendo uma espécie de acompanhamento, ficava um ceguinho com um bacia jogando uma moeda para o alto.

E como esquecer o compasso das batidas dos pés de Badé e seu terno branco? a força do chapeado Antonio Ferro Velho, o homem da tapioca com o bordão ‘tá quente, tá quente, tá quente’. A velha Honorina, Joca Pintor, Luiz do Óleo, Nizinho da Difusora e tantos outros trabalhadores honestos que foram embora sem homenagens. Foram meus heróis e ajudaram a construir a memória coletiva de Serra Talhada. Um bom domingo a todos!