Menos de 1% dos B.O's pela internet são investigados

Do JC Online / Foto: Bruno Campos / JC Imagem

Os números chamam muito a atenção e são um exemplo do descaso e da impunidade em Pernambuco. Estatísticas da Polícia Civil revelam que 96.150 boletins de ocorrência foram registrados pela internet no ano de 2022. Mas só 363 (0,37%) resultaram em inquéritos policiais.

Os dados, extraídos da Unidade de Estatística Criminal, foram obtidos pelo Jornal do Commercio por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).

Pelo menos 40 crimes podem ser registrados pela Delegacia pela Internet, como por exemplo ameaça, falsidade ideológica, vários tipos de furtos, violência doméstica familiar e até crueldade contra animais. (Veja lista completa mais abaixo)

Até o começo de maio deste ano, queixas de roubos também podiam ser feitas virtualmente, mas a Secretaria de Defesa Social (SDS) decidiu retirar a opção – sem aviso prévio à população – sob a justificativa de que as pessoas não sabiam preencher os campos, e poucas informações eram fornecidas à polícia.

A mudança, revelada pelo JC, resultou em críticas da sociedade e um pedido de explicações enviado pelo Ministério Público de Pernambuco ao governo estadual.

Policiais civis, ouvidos sob reserva, explicaram que cada delegacia (dividida por área ou município) precisa acessar os boletins de ocorrência virtuais para dar início às investigações. Mas, na prática, segundo eles, isso quase nunca acontece. Por isso o número tão baixo de inquéritos instaurados para apurar as queixas virtuais.

“As delegacias têm acesso, mas ninguém (nenhum policial) abre. As delegacias não vão atrás dos boletins de ocorrência on-line registrados em suas circunscrições para investigar por causa da alta demanda de trabalho”, relatou um dos policiais civis.

“A maioria da população acha que, quando registra a queixa pela internet, a delegacia já começa a investigação. De fato era para acontecer isso. As delegacias têm acesso, mas não fazem isso, porque a demanda é grande. Além disso, tem policial que não sabe nem entrar no sistema. O boletim de ocorrência fica perdido”, disse outro policial civil.

“Tem queixa de perturbação do sossego que a vítima cansa, pede ‘pelo amor de Deus’ para tomarem uma iniciativa, mas a polícia não investiga”, exemplificou.

A estudante recifense Isabelle Pires, de 18 anos, contou que foi roubada três vezes no ano passado. Nos dois primeiros casos, não quis registrar o boletim de ocorrência. Só na última decidiu fazer a queixa pela internet.

“Eu estava no ônibus, que estava parado no trânsito na Avenida Guararapes (Centro do Recife). O assaltante aproveitou que eu estava mexendo no celular, e, pela janela da frente, pulou e conseguiu levar meu aparelho”, disse Isabelle. O caso aconteceu em julho de 2022.

“Fiz o boletim de ocorrência na tentativa de conseguir resgatar o celular. Recebi depois o comprovante da queixa, mas a polícia nunca entrou em contato comigo para falar da investigação.”

POUCOS INQUÉRITOS REMETIDOS À JUSTIÇA

No documento com os dados disponibilizados por meio da LAI, a Polícia Civil sinalizou que parte das queixas resulta apenas em Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), e não em inquérito policial. Crimes contra a honra, por exemplo. Mas a Unidade de Estatística Criminal não especificou a quantidade de TCOs gerados.

Na realidade, os crimes de roubo (que antes podiam ser registrados on-line) e de furto representam a maioria dos boletins de ocorrência. E deveriam, imediatamente, ser transformados em inquéritos para identificar e punir os criminosos.