Por Auricleide Andrada – Professora de Geografia e História na Rede Estadual de Ensino e Faculdade de Formação de Professores de Serra Talhada.

Começo a escrever imaginando algo que deveria ser o lógico, coerente e o mais sensato, mas verdadeiramente não é. Como compreender a realidade dos 187 municípios pernambucanos em períodos que antecedem o pleito, a disputa eleitoral? Obviamente a resposta e as preocupações seriam centralizadas na cidade, nas questões relacionadas a ela, no direito e no dever nosso de pensar num espaço digno para todos os habitantes. Mas não é isso que ocorre, pois a sociedade do século 21 que cresceu tecnologicamente, não evoluiu do ponto de vista humano, é que
segundo Gabler: “vivemos em uma sociedade na qual ter informações, tornou-se mais importante do que pensar; uma era pós-ideias”. E aí é que pensar pode doer,mas gera algo novo, conhecimento, reflexões.

Voltando a realidade dos municípios, refletiremos o que vivenciamos em Serra Talhada e na análise poderemos verificar que esta se estende aos demais municípios, respeitando claro, suas especificidades. A Política como sabemos é a arte de governar, de gerir o destino da cidade e trata das relações de poder. Distantes estão às formas de como a nossa sociedade exerce seus direitos e deveres de cidadão politizado. Vejamos como o nosso povo quer fazer política: colocam um adesivo no carro e aí encontramos as seguintes frases: EDUQUE / NEM REI, NEM RAINHA, NEM
DUQUE SOU DO POVO/RENOVE/ O DOUTOR É DO POVO… Com todo respeito ao que o processo democrático exige: liberdade de expressão, levantar bandeiras…

Pensemos: Que cidade temos? Que cidade queremos?. De todos os setores sociais constatamos uma letargia ou ausência de debates, que fazem da política aquela com o P maiúsculo que tanto desejamos: um espaço para o diálogo, as divergências, os conflitos, os embates, com fóruns, seminários, discursões nos bairros, propostas… Independentemente de partido ou candidato o centro das atenções deveria ser a população que vive nos seus espaços, com seus problemas, suas lutas e anseios, é ela que precisa ser consultada, ouvida, pois são mesmas a apontar possíveis soluções ou alternativas para um viver melhor. Convenhamos, não é isto que vêm ocorrendo, estamos muito distantes de uma cidadania ativa, a população no geral despolitizada, com uma mídia sensacionalista, geralmente ligada aos grupos políticos partidários, a exemplo das rádios, aplaudem o jogo da politicagem, com o mais baixo nível de
difamações, intrigas que em nada ajuda ao processo democrático.

Pensar a política e o poder como algo democrático, participativo em que “os cidadãos controlam seus governos e participam dele, cobram responsabilidades dos diferentes atores do jogo social e ponham em curso processos alargados de deliberação, de modo que viabilizem lutas e discussões públicas em torno de como viver, de como governar e de como conviver”. (Nogueira, 2008). Reafirmo, longe estamos de uma cidadania ativa, até mesmo o exemplo vindo do Palácio do Campo das Princesas com um estranho estilo de governar, que segundo Zaidan é “caracterizada por um misto de gerencialismo e familismo (…). Tudo amparado por uma pletora de estatísticas e aparelhos de alta tecnologia de informação(…) tanta tecnologia a serviço de ideias, costumes e modos políticos tão antigos… como as oligarquias de Pernambuco”.

Perdoem-me, mas trazer à tona o debate, não é adesivar carros, é chamar esses atores para o jogo, para a ágora (praça em grego), não é usar práticas advindas do Brasil-Império: clientelismo, coronelismo, trocas de favores e etc. que fizeram nosso poeta Jessier Quirino nos seus versos em Paisagem do Interior dizer: “caminhão de eleitor com os votos tudo vendido, isso é cagado e cuspido paisagem do interior”. Infelizmente numa sociedade polarizada entre a carência e o privilégio como lembra Chauí (2010), não encontra meios para garantir a democracia, como garantias de
direitos. E aí só resta favor, substituição e paternalismo que evidenciam o cotidiano da prática política. Tipicamente é o que vêm ocorrendo em Serra Talhada, quiçá possamos verificar que haja exceções ou se pratica algo diferente nos demais municípios pernambucanos, se há desconheço.

E aí nós, educadores, que diariamente lidamos com uma geração que vai se formando, urge chamar nossos estudantes a discutir cidadania, educar para esta prática, que na verdade é politizar, tentar nos nossos diálogos dizer a importância
destes, que devem ser cidadãos interlocutores dos problemas da cidade. No livro: Brasil, cidades – alternativas para a crise urbana, Ermínia Maricato enfatiza que há um desafio, que é: “construir um espaço de participação social, que dê voz aos que nunca a tiveram, que faça emergir os diferentes interesses sociais (para que a elite tome contato com algo que nunca admitiu: o contraponto) é uma tarefa difícil em um país de tradição autoritária como o Brasil, mas altamente transformadora”.

É mister, ir ao cerne do debate, discutir as necessidades dos bairros no tocante a saúde , a educação,
a moradia (com um mercado imobiliário excludente e especulativo), ao meio ambiente, a cultura, ao lazer, afinal como lembra os Titãs: “ a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte…”. Nossos políticos estão numa briga do poder pelo poder, e no jogo entram aqueles que querem o privilégio e os que são usados como massa de manobra. Chamemos os nossos políticos para a ágora, para compreenderem que levamos a política como coisa séria, que gerir bem a coisa pública é uma forma de dar dignidade a vida de muitos, que vivem com migalhas de uma elite
que no Brasil concentrou terras, poder… , desde sua colonização mantendo o status quo. Afinal a cidadania sem dúvida se aprende. Segundo Milton Santos (1993): “Quantos no Brasil são cidadãos? Quantos nem sequer sabem que não o são?”. Nossos filhos nos agradecerão à medida que deixarmos de sermos simplesmente consumidores e nos tornarmos cidadãos, talvez melhor, politizados.

Referências:

Chauí, Marilena. Iniciação à Filosofia. São Paulo. Ática, 2010.

Jornal do Comércio. Opnião – A Fala do Trono. Michel Zaidan, 20 de fevereiro de 2012.

Nogueira, Marco Aurélio. Potência, limites e Seduções do poder. São Paulo. Unesp, 2008.

Santos, Milton. O Espaço do Cidadão. São Paulo. ,1993.

Maricato, Ermínia. Brasil, cidades: alternativas para a crise urbana. Rio de janeiro. Vozes,
2008.