são pauloPor Adelmo José dos Santos, poeta e escritor serratalhadense

Em 1974 quando eu cheguei em São Paulo com uma mão na frente e a outra atrás, fazia um frio de lascar. O meu corpo pedia abrigo e minha alma pedia paz. Era um mês sem ver o sol, quando a saudade batia eu lembrava a minha terra e os meus olhos se enchiam de vontade de chorar. Eu ficava aperreado, mas não queria voltar. O tempo foi passando, foram duros os primeiros anos pra poder me acostumar.

O meu amigo de pensão não sabia como era aquela selva de pedras, e não segurou a barra, um dia arrumou as malas e voltou pra sua terra. Eu saia pelas ruas a procura de trabalho, e voltava pra pensão só fazendo uns quebras galhos. As vezes eu ficava pensando vendo um mundo desigual, e no fundo eu sabia que na escola da vida, não podia levar pau. Numa placa de emprego uma vaga estava à vista, era a minha esperança, fui logo pra entrevista. Ao perguntarem pra mim se eu praticava algum esporte, eu respondi que jogava futebol de poeira e deram risada de mim, parecia brincadeira. Foi o meu dia de sorte, acabei sendo empregado e pra jogar no time da empresa eu fui logo convidado.

No dia da minha estreia o campo ficou lotado era uma alegria só, muita gente tinha ido só pra ver o meu futebol. Esse jogo foi atípico, eu acabei sendo a atração, a torcida me escolheu pra servir de mangação. Eu senti que a torcida tirava sarro de mim, eu era um barriga verde, era um cabeça chata, me chamavam de candango com lorotas e piadas. Era uma torcida mista tinha frouxo e valentão, mas todos deram pra trás quando eles ficaram sabendo que eu era de Serra Talhada, a terra de Lampião. O campo era gramado eu estava preparado, com meus 19 anos não bebia e não fumava, o único vício que eu tinha era jogar futebol nas peladas. Quando o jogo começou eu mostrei meu futebol, nesse jogo eu fiz três gols que serviram de respostas, deixei todos me babando dando tapinhas nas costas. E desse jogo pra frente eu só fui fazendo história, as portas foram se abrindo só porque eu jogava bola.

Tinha o time dos bacanas, tinha o time dos doutores, eu fui quebrando as panelas e acabei jogando em todos. Nas rodinhas e nas patotas nos lugares que eu ficava ninguém bulia comigo, quando alguém se atrevia querendo fazer piadas, logo outro advertia: Ele é de Serra Talhada! Foi assim que eu prossegui minha vida em São Paulo, se na escola e nos clubes eu era isento de bullying por ser de Serra Talhada, a terra de Lampião, nas blitzes da policia não havia isso, não. No grito: Mão na cabeça! Eu era sempre o primeiro a botar as minhas mãos e o último a retirar com muitas perguntas em vãos. Era coisa de policia que usava a ditadura como arma e proteção, abusando do poder sem nenhuma explicação, só porque meu natural era de Serra Talhada, a terra de Lampião.