ManuPor Emmanuelle Silva, estudante de Letras na UFRPE/Uast, militante social e estagiária no FAROL

Não poderia deixar de me posicionar sobre a notícia veiculada na seção de política do Diário de Pernambuco, nesta segunda-feira (23), que também repercutiu no Farol de Notícias, sobre a intenção do governador Paulo Câmara de criar uma secretaria-executiva para atender a população pernambucana dita “minoria” – homossexuais, negros, índios etc. Sobretudo, quero tratar sobre a postura dos deputados estaduais da bancada evangélica em oposição a essa secretaria, ao assumirem na Assembleia Legislativa (Alepe) a conduta atrasada e inadequada de misturar política e religião. Sem deixar, claro, de trazer a minha contra resposta a opinião pública.

negros-e-indiosÉ muito errôneo tratar as populações LGBT e negra como minoria, pensando unicamente em quantidade. A população LGBT em 2012 teve a estimativa de 18 milhões no Brasil, 78% dos brasileiros, segundo informações da revista Exame. A população negra do Brasil, no mesmo ano, foi estimada pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) e algumas outras instituições em 51%. Em 2010, os indígenas somavam em torno de 900 mil nas terras tupiniquins, mas esse número na época da colonização (século XVI) estimava dois milhões. Nossos antepassados indígenas foram dizimados e hoje em dia passam por milhares de burocracias para ao menos ter acesso às suas terras. Ainda assim, em números isso não é pouco, mas em igualdade de direitos, em acesso aos recursos públicos e a legitimação dos grupos sociais, somos minoria.

Sabemos que a Constituição brasileira estabelece no Art. 5º que nós sejamos iguais perante a lei, esse artigo apresenta também 78 incisos e mais quatro parágrafos que estabelecem várias especificações que também precisam ser conhecidas por todos, já que é tão citado. Esses incisos e parágrafos deveriam reger, assim como todo o documento da Constituição, em prol da garantia de direitos a todos os cidadãos brasileiros independente de raça/cor, etnia, sexualidade, gênero, posicionamento político etc. Existem várias brechas interpretativas na legislação brasileira que podem respaldar discursos preconceituosos e discriminatórios, no entanto isso ainda não é justificativa.

Ao mesmo tempo, penso que muitos políticos ainda impõem fundamentos religiosos nesses aspectos legislativos, os quais bandeira lgbtnão deveriam fazer parte dessa esfera. Não é uma crítica a religião alguma, mas um posicionamento contrário ao fato da bancada evangélica, que se mostra muitas vezes radical, querer impedir a criação dessa secretaria-executiva no estado. Equipamento público que vem para discutir e direcionar políticas a grupos sociais, que historicamente não tiveram legitimidade e garantia de direitos. Isso é inconcebível!

Creio que os argumentos dos deputados também estão inadequados. O deputado Cleiton Collins (PP) e tantos outros sequer perceberam que a secretaria deverá atingir a esfera de desenvolvimento social e não uma secretaria LGBT. Dizer que a homossexualidade na escola não é normal é querer que futuros cidadãos pensem igual ao senhor, alienados a uma realidade social tão comum e que em nada afeta as relações sociais de outros grupos. É desesperador saber que esse deputado foi o mais votado em Pernambuco, quantas pessoas apoiam pensamentos tão descabidos à contemporaneidade.

O senhor André Ferreira (PMDB) disse: “A família tradicional é a base da sociedade sadia”. Ainda essa história que os homossexuais são doentes? Esse discurso está fora de moda há anos, fortaleça sua retórica, deputado. Entre usar o livro sagrado ou o documento histórico máximo dos cristãos (vejam como queiram), citar a bíblia também é clichê e não deveria ser utilizada no púlpito de uma Assembleia Legislativa. Todas as instituições públicas comprometidas com o trabalho social que têm que realizar já discutem o fato de “família tradicional” está muito além de um casal heterossexual e seus filhos.

interrogaçõesEntretanto, a bancada conseguiu ultrapassar todos os limites e o soldado Joel da Harpa (Pros), soltou a pérola: “O negro nasce negro e continuará negro. O índio nasce índio e também continuará assim o resto da vida. Mas conheço vários homossexuais que deixaram de ser homossexuais […]. Daqui a pouco um camarada vai querer fazer sexo com animal e o estado vai criar políticas públicas para a pessoa que quer fazer sexo com animal”. É muito preconceito e falta de conhecimento para um único comentário. O que zoofilia tem a ver com homossexualidade? Nada, absolutamente nada.

A intenção do governador de Pernambuco é louvável, por ao menos querer abrir esse espaço de discussão. Não quer dizer necessariamente que a resolução dos problemas chegará. Seria utópico demais para qualquer militante, por mais ufanista que seja. Mas a postura desta bancada da Assembleia é vergonhosa, não levem os templos religiosos para os espaços políticos. Além de nem todos partilharem ideológica e religiosamente com essas concepções, a religião pode servir de subsídio para outras ações, não as legislativas. Se orientem deputados!

Por hoje é só pessoal.