rádio

Por Adelmo José dos Santos, faroleiro

Nos anos 50 e 60 aqui em Serra Talhada o melhor amigo do homem depois do cachorro era o rádio. Era comum encontrar as pessoas pelas ruas com um rádio de pilhas nas mãos, ouvindo um jogo, as notícias ou curtindo música. Em 1964 quando eram três horas da tarde, as pessoas se juntavam ao pé do rádio pra curtir mais um capítulo da radionovela “O Direito de Nascer,” que passava na Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Mamãe Dolores agradava, Isabel Cristina engravidava e Dom Rafael deixava todo mundo nas cadeiras e tamboretes ficando cheios de raivas.

Os jornais da capital não chegavam em Serra Talhada, as notícias eram através do rádio. Miguel Arraes deportado, milésimo gol de Pelé, e o homem pisando na lua foram as principais notícias transmitidas pelo rádio na década de 60. Em 1968 a emoção foi ao extremo, o rádio dava a notícia o cantor Roberto Carlos acabava de ganhar o festival de San Remo.

Em 1969 enquanto lá em cima no céu o homem pisava na lua, aqui embaixo na terra a estrela que brilhava era a do Rei Pelé, que não pisava na bola, mas jogava e dava show. Acabava de fazer o seu milésimo gol. O rádio dava as noticias deixando o povo informado.

rádio3

Era o milagre do rádio, só mesmo a copa do mundo juntamente com a novela pra deixar o pé do rádio rodeado com plateia. Era o trote dos cavalos, o latido dos cachorros, atores contracenando e as pessoas ao pé do rádio prestando muita atenção, para entender a novela usando a imaginação. Eu via o mar no meu rádio, a fazenda e os cavalos na hora da radionovela o Direito de Nascer.

Era muita emoção pros adultos e pras meninas quando passava uma cena com Albertino Limonta beijando Isabel Cristina. A época deixou saudades, das tristezas eu não falo, é melhor deixar pra lá. E pra não dizer que não falei das flores, o cantor Geraldo Vandré era preso e torturado com sua música proibida de poder tocar no rádio.

Os estudantes gritavam “Abaixo a Ditadura!” E a polícia respondia baixando o cacete. Enfim chegou a copa, faltam seis dias para a bola rolar. Eu sinto falta do rádio e relembro as emoções que só o rádio trazia dentro da sua magia para os nossos corações. Pelo o rádio eu viajei sem sair da minha casa, entrei no Maracanã sem deixar Serra Talhada.

Eu “vi” tudo no meu rádio: o drible elástico de Rivelino o seu chute era um canhão, vi os gols de Jairzinho que também foi furacão, vi as defesas de Manga com a bola em suas mãos, e a magia de Garrincha entortando mais um João.

rádio2

Numa jogada aconteceu um milagre de Pelé, um gol que ele perdeu veio a se imortalizar, reprisaram tantas vezes que eu vi a bola entrar. Foram grandes locutores que ficaram na história, “o cara” era Osmar Santos pela Rádio Globo de São Paulo inovava nas gracinhas, quando o jogador errava era: “Pisa no tomate!” “Pimba na gorduchinha!”. Na copa de 94, pitoresco Galvão Bueno com as defesas de pênaltis levava o goleiro ao céu, gritando para todo mundo: “Vai que é tua Tafarel!”. O rádio botava teima e mexia com a imaginação, fazia o torcedor sentir muita emoção.

Era a bola na trave, era o gol que não saía, era um pênalti marcado que o goleiro defendia, era a torcida nervosa no momento de agonia. Na hora que o gol saía era tudo alegria. O rádio e a televisão foi Davi contra Golias, um cabia em qualquer canto e o outro não cabia. Quem salvou a televisão foi a tecnologia, é o rádio botando teima e a televisão tirando. Num veículo, a bola passa longe… No outro passa raspando.

Hoje a televisão é um cinema em casa, tem TV LCD, de plasma, LED e HD. O rádio, por sua vez, alimenta a imaginação. Alguns podem pensar que parou no tempo e não passou do ABC. Mas que pelas ondas do rádio o Brasil possa continuar surfando e, agora, na tela da TV o Galvão possa botar a sua emoção a mil gritando para o mundo:

“OLHA O GOL!” OLHA O GOL!” OLHA O GOL!” É DO BRASIL!” É DO BRASIL!”