Do UOL

Foto: Tuane Fernandes/UOL

Evangélica desde o berço, a pastora paraense Jacques Chanel, 56, realizou nesta semana um sonho. Celebrou na segunda-feira (20) o primeiro culto presencial da Igreja Trans ICM Séforas, no Centro de São Paulo.

Foi um dia muito especial porque não imaginava que meu comprometimento com Deus tivesse caminhado de tal forma que me levasse a abrir uma igreja trans numa sociedade que só quer me matar e excluir.”

Consagrada pastora em maio deste ano, Jacques já chegou a ser expulsa de algumas igrejas. Ela conta que começou a promover encontros com pessoas trans há oito anos, quando entrou em uma igreja inclusiva.

“Lá encontrei uns 300 gays, mais umas duas travestis, e logo comecei a me posicionar e a pedir para a diretoria por mais trabalho de evangelização e acolhimento da comunidade trans, para, aí sim, ser uma igreja inclusiva.”

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Sem encontrar o acolhimento que buscava, seguiu em sua busca até chegar à ICM (Igreja Cristã Contemporânea), uma denominação inclusiva para o público LGBTQIA+ e que existe há 50 anos:

Lá [na ICM] abriram espaço para mim e comecei a receber pessoas trans em situação de rua, promovi bazares para doação de roupas e fiz jantares. Era assim que aconteciam as nossas reuniões.”

Com o trabalho, ela foi chamada para receber o que na igreja se chama consagração, e tornou-se pastora. No mesmo momento, lançaram a ideia da igreja trans.

Eu não tenho a menor dúvida de que sou um instrumento de Deus e de que as pessoas conseguem ver a luz de Jesus em minha vida.”

“Ou você vira mulher ou morre””

Aos cinco anos de idade, Jacques ouviu a mãe ameaçar colocá-la num colégio interno caso não perdesse o jeito que chamada “afeminado”. Ela prometeu que se mudaria, mas, aos 13 anos, foi deixada pela mãe na Igreja do Evangelho Quadrangular, em Belém (PA), onde viveu até os 19 sob os cuidados de um pastor, que foi assassinado.

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“Essa questão de família foi superada com a fé. Fui expulsa umas três vezes de casa e, com a morte do meu pai, há dois anos, fui excluída da partilha de seus bens. Minha mãe disse que, como fui embora, não tinha direito a nada.”

Sem emprego e sem o apoio da família, Jacques chegou em São Paulo há 30 anos e começou a trabalhar como cabeleireira. “Por ser uma das maiores cidades do país, tive a visão inocente de que não fosse passar por preconceito, mas foram acontecendo coisas absurdas que mudaram minha vida.”

Para o evangelho fundamentalista, isso é, no mínimo, um pecado, uma aberração, uma mutilação, e me questionei várias vezes sobre a minha decisão. T e tentei o suicídio três vezes, mas consegui superar. Busquei forças em Deus, e se não fosse Ele, não estaria mais aqui.”

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Os cultos na igreja acontecerão todas as segundas, e além deles, Jacques prepara agora a terceira edição da Parada Trans, em janeiro.

Quero iniciar a parada com louvores gospel, com ritmo dance, para causar.”