Um homem que deseja ter uma vida normal em Serra Talhada
Estudante Felipe Nunes fala sobre importância do Dia da Visibilidade Trans – Foto: Arquivo Pessoal

Celebramos no último dia 29 de janeiro, o Dia da Visibilidade Trans. Em respeito e representatividade da população transexual e travesti de Serra Talhada, o Farol conversou com Felipe Nunes, 25 anos, natural de São Paulo, mas que adotou a capital do xaxado como sua terra natal. Felipe é homem trans gay e abriu seu coração para contar como é sua trajetória enquanto pessoa transexual.

Ele aproveitou para explicar que nasceu biologicamente mulher, mas sua identidade de gênero é masculina. Além disso, esclareceu que é um homem que se relaciona amorosa e sexualmente com outros homens.

“Falar sobre este assunto é motivo de orgulho pra mim, pois isso é o que sou. Não é só mais uma história de vida, é uma trajetória de luta por inclusão. Por respeito, por igualdade, que certamente vai ajudar outras pessoas que estão em transição a entenderem o processo”, comentou Felipe, continuando:

“Desde a infância eu já me sentia diferente. Nunca gostei de usar vestido e saia, nas brincadeiras eu sempre era o pai das minhas bonecas. Usava muita roupa do meu irmão escondido quando ninguém estava em casa. Colocava as roupas dele e ficava em frente ao espelho me admirando. Me achando o máximo”.

Um homem que deseja ter uma vida normal em Serra Talhada
Felipe antes de iniciar sua transição – Foto Arquivo Pessoal

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ADOLESCÊNCIA E AUTOCONHECIMENTO

Durante a adolescência, Felipe passou por episódios que provavelmente toda pessoa transexual teve que enfrentar. Descobrir e validar a si mesmo quando seu corpo mostra o contrário. Foram anos escondendo os cabelos com um boné. Os seios o incomodavam, a menstruação o desestabilizava. Felipe não se sentia em casa dentro daquele corpo.

“Lembro de um dia que parei em frente ao espelho com um estilete na mão pensando em cortar meus seios fora, pois não aguentava ver aquilo. Hoje, já consigo lidar melhor com a questão, mas ainda é minha maior disforia [sentimento de angústia em relação a não correspondência do sexo biológico]. Meu sonho é fazer a cirurgia de mamoplastia masculinizadora”, conta o rapaz.

Para ele, o conceito cultural de menstruação como o símbolo de “tornar-se mulher” era uma lembrança dolorida de tudo o que ele não era e não sonhou ser.

“A menstruação também foi um episódio bem marcante. A cada mês eu me sentia pior. Para mim era um lembrete mensal de que eu não era o homem que eu sonhava em ser. Me sentia no fundo do poço”, desabafou o jovem, continuando:

“Nessa fase virei muitas noites chorando sem nem entender o motivo. Até que entrei na faculdade e conheci amigos maravilhosos. Foi aí que ocorreu a virada de chave. Conviver com pessoas LGBTQIAPN+ foi extremamente importante nesse processo de autoconhecimento e aceitação”.

REDE DE APOIO: A IMPORTÂNCIA DE SER ACOLHIDO 

Para Felipe o processo de afirmar sua identidade perpassa por suas relações familiares e de amizades. Morando com a mãe e com irmão, ele diz que a convivência com eles é bastante tranquila. No entanto, sua maior rede de apoio são seus amigos.

“Eles são de boa. Minha mãe se esforça para entender, mas sente dificuldade em me chamar de Felipe. Sinto que ela reluta muito, mas nossa relação é boa. A maior aceitação que tive foi com meus amigos. Me relaciono com todo tipo de gente, é muito bom contar com amizades de verdade. Eles são minha rede de apoio. No trabalho tive uma enorme aceitação também. Me sinto extremamente acolhido e os colegas são extremamente de boa quanto a isso”.

Um homem que deseja ter uma vida normal em Serra Talhada

DIA DA VISIBILIDADE TRANS 

Felipe acredita que o Dia da Visibilidade Trans vem para reafirmar a existência da população e lembrar que ainda há muito a ser feito em termos de políticas públicas e justiça.

“Essa data para mim é extremamente importante. Dar visibilidade a pessoas trans é legitimar a importância de garantir o cumprimento de suas reivindicações. Desmentindo informações equivocadas e assegurando direito à cidadania. Trata-se de uma data que reafirma a dignidade da população transexual e travesti, sensibilizando para a garantia de seus direitos”, explicou.

OS DESAFIOS DA TRANSIÇÃO

Em tratamento hormonal há 4 meses, Felipe acalenta um sonho que pode parecer banal para nós. Mas mesmo o comum se torna esplêndido.

Sobretudo, quando você tem que enfrentar diariamente o peso do mundo. Que asfixia com rótulos e engessa em padrões. Ele quer ter uma vida normal.

“Estou curtindo o processo. Os hormônios são só o começo de uma grande TRANSformação. Quero muito fazer a cirurgia de mamoplastia masculinizadora. Será minha próxima meta a concluir em relação a transição. Passei 19 anos buscando algo que eu não sabia o que era. Até o momento que percebi que o meu desejo era só ser um homem normal. Com uma vida normal, sem nada de diferente” finaliza Felipe.