Da CNN

Foto: REUTERS/Siphiwe Sibeko

O governo da África do Sul está considerando permitir que as mulheres tenham vários maridos, uma possibilidade que causou alvoroço entre os conservadores do país.

A proposta de permitir a poliandria – nome dado à essa prática – foi incluída em um livro verde do Departamento de Assuntos Internos da África do Sul, que espera tornar o casamento mais inclusivo.

Um livro verde é um tipo de documento do governo que todos os interessados podem estudar e sobre o qual podem fazer sugestões, especialmente antes de a legislação ser alterada ou uma nova ser criada.

A opção é apenas uma entre várias em um documento abrangente, mas causou intenso debate na África do Sul.

A poligamia, na qual homens se casam com várias esposas, é legal no país.

“A África do Sul herdou um regime de casamento baseado nas tradições calvinistas cristãs e ocidentais”, observa o documento, acrescentando que as atuais leis de casamento “não são baseadas em uma política abrangente embasada nos valores constitucionais e na compreensão da dinâmica da sociedade moderna”.

O documento destaca que a lei atual permite o casamento de menores e não contabiliza casais que mudam de sexo e desejam permanecer casados sem passar pelo divórcio, entre outras falhas.

Como parte do esforço para fortalecer a política de casamento, o departamento consultou líderes tradicionais, ativistas de direitos humanos e outros grupos sobre os principais pontos em discussão.

Os ativistas de direitos humanos “afirmaram que a igualdade exige que a poliandria seja legalmente reconhecida como uma forma de casamento”.

As autoridades descobriram que as pessoas têm opiniões muito diferentes sobre o casamento, mas uma das propostas apresentadas é elaborar um esquema de casamento de “gênero neutro”.

“A África do Sul poderia dispensar a categorização dos casamentos segundo linhas de raça, orientação sexual, religião e cultura”, diz a sugestão.

“Isso significa que a África do Sul (poderia) adotar um sistema duplo de casamentos mono ou poligâmicos”.

Devido ao elemento neutro em termos de gênero, esta opção se aplicaria tanto a mulheres quanto a homens, se fosse aprovada e, portanto, permitiria a poliandria.

Os conservadores do país ficaram chocados com a sugestão.

Entre os que criticam a proposta, um dos mais famosos é o empresário Musa Mseleku, uma estrela de reality show que tem quatro esposas.

“Sou pró-igualdade”, afirmou Mseleku em um vídeo em seu canal no Youtube postado em maio no qual afirma que a poliandria colocaria em questão a paternidade das crianças.

“A criança vai pertencer a qual família?”, perguntou o artista. “Mais do que isso, somos pessoas espirituais. Nosso espírito, nosso criador, garantiu que somos criados dessa maneira. A ideia é estranha”, continuou.

Mseleku também abordou no tema no Facebook. “Proteger nossa existência é importante tanto para a geração atual quanto para as futuras”, escreveu em um post em 17 de maio. “Vamos defender nossa cultura, tradição e costumes participando desse processo. Vamos nos opor abertamente à poliandria”.

Segundo o Departamento de Assuntos Internos, a ideia de que a poliandria não é autenticamente africana também prevaleceu entre os líderes religiosos.

O documento observou que, durante as discussões com os líderes tradicionais, ficou claro que eles acreditavam que “somente os homens podem ter várias esposas”.

O documento acrescenta: “Consequentemente, os líderes tradicionais consideram a poliandria uma prática inaceitável porque não é de origem africana”.

O reverendo Kenneth Meshoe, líder do Partido Democrata Cristão Africano, foi um desses religiosos que se opôs à proposta. Em entrevista à emissora sul-africana eNCA, Meshoe disse que embora a poligamia fosse “uma prática aceita”, a poliandria não era.

“Homens são ciumentos e possessivos”, afirmou Meshoe, explicando por que um casamento com vários maridos não funcionaria.

Em outro trecho do documento, autoridades escreveram que “embora algumas partes interessadas acreditassem na prática da poligamia, também havia aqueles que se opunham a ela. Isso também se aplica à prática da poliandria. Ironicamente, aqueles que apoiam a prática da poligamia são contra a poliandria”.

Atualmente, o governo sul-africano está fazendo consultas sobre o documento, que se encerram em 30 de junho. Comentários sobre todas as propostas envolvidas são bem-vindos.