Do Diario de Pernambuco 

Primeiro o desencanto os levou a protestar na Colômbia. Em seguida, os confrontos com a polícia e os mortos. Quando as ruas foram silenciadas, uma “caça às bruxas” levou 2.000 manifestantes à prisão, denunciam organizações sociais.

Em Paipa e Sogamoso, no departamento de Boyacá (noroeste), sete jovens foram presos no dia 22 de novembro.

“O Ministério Público nos apresenta como um grupo radical organizado que é perigoso para a sociedade e que tem um ódio irracional pela polícia”, diz à AFP a estudante de direito Juliana Higuera, de 21 anos.

O fato de ser mãe solo de Salomé, de 5 anos, rendeu-lhe prisão domiciliar. Cinco de seus amigos ainda estão atrás das grades.

Brigget Supelano, 22, sofreu o mesmo destino de Juliana por seu filho Adrián, 4, que presenciou sua prisão em plena madrugada. Dezenas de policiais bateram às suas portas enquanto dormiam. Foram capturados simultaneamente e alguns foram levados em caminhonetes particulares, segundo denunciam.

“Só por querer mudar o país, por lutar pelos nossos direitos. Não fizemos nada de errado”, sustenta a jovem contendo as lágrimas.

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Sem educação e sem trabalho, Brigget cria seu filho na pobreza e ainda enfrenta uma doença no sangue que a obriga a ir com frequência ao hospital.

Centenas de milhares de manifestantes saíram às ruas do país entre abril e junho de 2021 em repúdio ao aumento de impostos proposto pelo governo e que finalmente foi retirado ante a pressão popular.

Os protestos foram em sua maioria pacíficos, embora tenham ocorrido bloqueios de estradas, depredação e confrontos com as forças públicas, com um saldo de quase 60 civis e dois agentes mortos.

42% na pobreza

O Ministério Público informou a prisão, no âmbito do surto social, de 1.925 pessoas, das quais 1.464 já estão em liberdade. O órgão não especificou se os 461 restantes ainda estão detidos.

O Ministério da Defesa fala em “259 detenções de criminosos e delinquentes da Primeira Linha”, uma facção de manifestantes encarregada de repelir os ataques da polícia.

Em Boyacá, quatro homens e três mulheres foram acusados de formação de quadrilha para cometer crime, porte e tráfico de substâncias perigosas e violência contra servidor público.

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A Colômbia vive um movimento de protesto sem precedentes desde 2019, que periodicamente leva milhares de pessoas às ruas em um dos países mais desiguais do mundo, onde 42% de seus 50 milhões de habitantes vivem na pobreza.

Desta vez, a repressão policial alimentou o descontentamento e gerou um alerta da ONU.

Sem uma liderança definida, os jovens clamam por uma reforma policial e um Estado mais solidário.

“Isso não vai nos intimidar. Ser defensor dos direitos humanos não é crime, protestar não é crime”, diz a ativista Juliana, acusada pelo Ministério Público de liderar o suposto grupo formado pelos sete detidos.
De uma delegacia de polícia, os capturados compareceram a três dias de audiências virtuais. O MP apresentou o depoimento de uma testemunha e interceptações telefônicas nas quais alguns dos detidos falavam de “gasolina”, “pólvora” e bloqueios de estradas.

Essas pessoas não apenas “criaram um grupo radical organizado (…) com o único propósito do confronto direto. Aqui não há luta de um povo, nem luta social, aqui há uma luta direta de ódio e vandalismo”, lançou o promotor do caso.

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Um juiz determinou que esses sete jovens são um “perigo para a sociedade” e não poderão se defender em liberdade. Os advogados apelaram da decisão.

“Querem matar os que pensam diferente, querem trancar, querem calar a boca?”, pergunta Esperanza Ávila ao lado de uma pilha de fotos de seu filho, Julián Barón (20), um dos sete detidos.

Por suas realizações acadêmicas, recebeu uma bolsa de estudos universitária em Bogotá e tinha a chance de se tornar o primeiro com ensino superior da família, diz. Seu pai é bombeiro e Esperanza dirige uma barraca de comida.

A prisão foi seguida de medo constante. Detida em casa, Juliana vive o Natal mais “doloroso”. “Estou sempre assustada”, confessa.