Por Diego Carvalho, Tabelião, Poeta e Advogado Serra-talhadense

Num certo dia, em uma casa de oração espírita, discutia-se com muito zelo alguns conceitos básicos da doutrina.

Falava-se sobre caridade, apontando que a mesma deve ser espontânea e não oportunista, dando como exemplo uma situação de prestação material que ocorrerá na década de divulgação das obras espíritas.

Posteriormente foram apresentados exemplos ilustrativos que foram confirmados com passagens isoladas do Evangelho.

Pois bem, embora tenha ficado em silêncio; em respeito aos participantes que ali se encontravam, gostaria de tecer alguns comentários sobre o assunto, fazendo com muito respeito algumas reflexões pessoais sobre o tema tão importante para o nosso cotidiano, além de ser o ponto de partida da reforma íntima.

Primeiro – gostaria de ressaltar que a verdadeira caridade se inicia na vontade do sujeito, ou na intenção de fazer o bem ao próximo, independente de ser realizada publicamente ou isoladamente. Jesus não pedia para as pessoas se afastarem no momento de suas ações, mas que testemunhassem e divulgassem seus atos.

Segundo – não basta somente vontade, é necessário uma ação interessada e que seja eficaz do ponto de vista físico, intelectual e material.

Então, o que premia a passagem indicada por Kardec no “óbolo da viúva” não é sua ação em dar tudo que tinha, mas o exemplo que foi extraído daquele ensinamento.

Dessa forma, não podemos concluir que o simples fato em dar tudo que temos é suficiente para garantir nosso lugar no céu, quando o interesse próprio é maior que o interesse coletivo.

Terceiro – não podemos considerar como um exemplo de caridade doarmos tudo que temos aos outros e esquecermos de cuidado próprio, isso é egoísmo disfarçado, pois estamos utilizando uma desculpa para fugir de nós mesmo.

Quinto – todos nós temos interesse em algo, seja de forma consciente ou inconsciente. Isso não é diferente com o espírita, que tem por garantia “bônus hora”, citado veemente nas obras espíritas, mas isso não é ruim, pelo contrário é um incentivo para fazer o bem.

Seria hipocrisia pensar de forma diferente, pois o interesse faz parte de nossa sociedade; não iniciando hoje ou ontem, mas desde sempre. Portanto, seria ingênuo pensar em espírita imaculado e totalmente desinteressado.

Por fim, para concluir esse primeiro ponto, digo que a caridade parte do interesse, pelos argumentos apresentados acima, pois tudo inicia na vontade, impulsionada por algo, seja de forma consistente ou inconsciente, afinal não somos robôs, mas seres humanos criados em uma sociedade capitalista, desigual, racista e preconceituosa.

Sobre as formas de fazermos caridade, citada na época de Kardec, em darmos prestação material, isso é muito nobre, afinal a FOME/DESIGUALDADE é uma realidade existente, MAS já ficou provado que o simples fato de dar não é suficiente.

É necessário mais que isso,  atacar o problema na fonte. Devemos cobrar políticas públicas eficazes, afinal como já dizia os Titãs: “a gente não quer só comida, a gente que comida, diversão e arte”.

Os problemas mudaram, as abordagens devem ser feitas de forma dinâmica. Um bom exemplo é o reconhecimento da igreja católica sobre as necessidades dos homossexuais, não agindo mais como julgadores de plantão, mas reconhecendo com muita dignidade e respeito a opção escolhida por cada um.

Infelizmente, no espiritismo esse assunto não é tratado de forma clara, apresentando várias opiniões contraditórias sobre o assunto, afinal seria hipocrisia apontarmos a obsessão como justificativa para tudo que é contrário ao seu ponto de vista.

Para finalizar, poderia dizer que a divulgação de fotos de ações nobres não desnatura o conceito de caridade. Se o interesse coletivo for superior ao interesse individual, pois má-fé não se presume, teria que ser comprovada, o dano à imagem do sujeito, para ensejar responsabilidade civil.

Gostaria de lembrar que isso é apenas uma opinião pessoal.