Do Jornal do Comércio

 

O Nordeste é uma Nação. São 57,7 milhões de pessoas com sotaques diferentes em cada um dos nove Estados da região. Distintos, mas unidos por uma força e um jeito peculiar. Um povo que representa quase um terço (27%) da população brasileira e que traz na sua história uma herança da luta, insurreição.

Neste sábado, 8 de outubro, comemora-se o Dia do Nordestino. Nestas eleições, mais uma vez a região foi o coração da apuração dos votos no Brasil. Votação que fez a diferença e garantiu ao candidato à presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a vitória no primeiro turno contra Jair Bolsonaro (PL).

A região deu ao petista 12,9 milhões de votos de vantagem sobre o adversário, com um placar de 66,7% a 27%. É verdade que o atual presidente também avançou na região, mas nada que se compare aos mais dez pontos percentuais que os nordestinos garantiram a Lula na eleição.

Com o resultado, o Nordeste entrou na pauta política com uma enorme repercussão na redes sociais e na imprensa, sob insultos xenofóbicos feitos por grupos bolsonaristas ao voto da população da região. O próprio presidente Bolsonaro também se posicionou negativamente nas redes sociais, dizendo que o PT passou pelo Nordeste e deixou o analfabetismo como herança. Em outras palavras, uma forma de desqualificar o povo nordestino.

Em live nesta sexta-feira (7), o presidente também questionou o que Lula teria feito pelo Nordeste, dizendo que nemum programa decente de transferência de renda, como o Auxílio Brasil, ele deixou.  O ex-presidente respondeu dizendo que ele fosse caçar voto entre os milicianos, porque “quem tem uma gota de sangue nordestino não vota nesse monstro”, rebateu.

Sociólogos e cientistas políticas consideram que a ‘insurreição” do povo nordestino de manter a maioria dos votos em favor de Lula é resultado da herança das políticas públicas adotadas durante os governos de Lula e Dilma e do período de desenvolvimento econômico que se viveu na região, com o Produto Interno Bruto crescendo perto de 7%, apelidado na época de PIB chinês.

Na avaliação do professor de sociologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Sidartha Sória e Silv, ao contrário do que se imagina, o nordestino não é um pobre-coitado que está votando por desconhecimento. O que existe é um comportamento calculado e pragmático do eleitorado.

“A idenficação do eleitorado do Nordeste com Lula e o fato de que o governo Bolsonaro tentou trazer esse eleitorado para o lado dele, apelando para os programas emergenciais, como o Auxílio Brasil, e que isso não se confomou, seria uma evidência da tese do eleitorado pragmático, independentemente do corte de renda dele”, afirma.

O sociólogo destaca que mesmo a região tendo sido mais beneficiada pelo Auxílio Brasil por ter uma população mais pobre em relação a outras regiões, isso não foi suficiente para uma mudança de voto.

“O fato é que o eleitorado continuou votando em Lula e contra o governo e isso sugere que o eleitor fez um cálculo.  O cálculo político e pragmático teria sido: esse governo passou anos sem dar maior atenção as demandas e problemas e necessidades da população de mais baixa renda. E agora, às vésperas da eleição, resolve voltar com isso. Eu não vou cair nessa. Isso é um cálculo mental pragmático”, analisa.

O Auxílio Brasil é a principal plataforma de Bolsonaro em busca de apoio no Nordeste. Metade (47%) dos beneficiários do programa estão na região. O próprio lançamento do programa, em novembro de 2021, foi uma estratégia para construir uma marca pessoal e tentar apagar o legado do Bolsa Família, criado por Lula. Às vésperas das eleições, Bolsonaro aumentou o valor do benefício para R$ 600 e iniciou a distribuição de um número recorde de cartões, estampados com a bandeira do Brasil, símbolo bolsonarista.

 

DIA DO NORDESTINO

Criada há 11 anos, a data foi uma proposição do Legislativo de São Paulo, que naquele 2009 decidiu homenagear o poeta cearense Patativa do Assaré (1909-2002) – no centenário de seu nascimento – e, junto com ele, todos os nordestinos. O povo da região é parte da construção do Brasil e tem o direito de exercer sua cidadania nas urnas nas cores que lhe convier.