Fotos: Farol de Notícias/Celso Garcia

Publicado às 05h47 desta quinta-feira (3)

Uma senhora alta foi vista com um balde cheio de água ao seu lado, uma ‘rodia’ coroando a cabeça, um olhar cansado, de quem trabalha há 21 anos pelas ruas do cemitério de Serra Talhada. Todos os dias empunha a enxada retirando os matos que crescem, carrega na cabeça o balde para aguar as 40 covas  que lhe foram confiadas por aqueles que ali enterraram seus familiares. Maria José da Silva, 63 anos, moradora do Bairro Bom Jesus, é uma guerreira que luta contra a idade e os limites do seu próprio corpo, num exercício diário, que o joelho cansado, já mostra sinais de que a hora de parar chegou, mas a vida de quem precisa sustentar a família, os três netos que cria, grita mais alto pedindo para continuar. 

 Maria José contou para o Farol de Notícias que o que ganha por cada cova que cuida é pouco, não chega ao valor de uma salário mínimo, e precisa pagar aluguel, água, luz , fazer feira, e o gás de cozinha, que ela reclama do aumento absurdo. Ela trabalha de domingo a domingo, cumprindo oito horas diárias de serviço. Sem uma data certa para receber, há ainda os que atrasam, os que não pagam nunca, os que fazem promessas. Ela sofre as consequências dessa falta de respeito de quem não reconhece o mal que faz por meio da calotagem, e sofre o medo de não receber  e atrasar o aluguel que já vence nesta quarta-feira (2).

O serviço custa R$ 20 ou R$ 30 por mês

“Se eu não trabalhar aqui, a gente passa fome, porque eu vivo daqui, não tenho outra ajuda. Não recebo salário, aqui o pagamento é por cova. Uma cova dessas é R$ 20, R$ 30 por mês, e ainda leva calote, uns pagam e outros não, e assim a gente vai levando. Vamos supor, eu recebo dia primeiro, dia dez, dia 20, final do mês, é um pinga, pinga. Eles vêm, se engraçam da pessoa e chamam, mandam zelar aquela cova. Todos os dias, passo o dia com fome, porque eu não tenho quem faça, só faço à noite quando chego [em casa]. Eu não recebo [Auxílio Brasil], fui cortada há três anos. Nunca assinei carteira na minha vida. Toda a vida só trabalhei assim”, revelou Maria José, discorrendo:

“É um trabalho pesado porque você tem que carregar um balde na cabeça, você tem que limpar com a enxada; se você vai plantar uma planta, é com a enxada, também coloco estrume. As pernas estão nesta situação, para trabalhar tomo remédio. Venho para o cemitério mancando. A família que eu tenho são os meus filhos. Eu trabalho sozinha. Meu neto veio somente hoje para me ajudar, porque ele ainda não terminou os estudos. O meu prazer é que ele se forme. Trabalho para o ajudar. O sofrimento é grande! Trabalho para que ela [neta] não passe necessidade, prefiro que eu passe”, disse.

Sobre o futuro

“Eu não penso mais no futuro, já esperei tanto na vida, nunca consegui nada. Graças a Deus que ainda estou viva, mas nem saúde eu tenho. Eu não tive sorte de conseguir nem uma casa na Vila Bela, tanta casa abandonada lá, já roubaram portas, janelas, mas a gente não tem sorte. Vou levando a vida até o dia que Deus quiser. Eu tenho esperança que Deus venha fazer alguma coisa por nós”, declarou Maria José.