JUMENTOPor Luciano Menezes, Historiador com Pós Graduação em História do Brasil e Geral

O motorista, orgulhosamente humano, consequentemente “racional,” ao menos na proposição conclusiva afirmada pelo próprio homem. Dotado de “razão,” o homem, inclusive o motorista, reservou para o jumento as agruras de uma classificação amplamente pejorativa – seria um ser totalmente estulto.

O motorista presunçoso como sempre, “racionalmente” acelera em demasia, mesmo consciente do próximo semáforo ou da lombada a cem metros. Enquanto o jumento, por sua vez, possui uma visível tranquilidade – representando uma corporificação do presente, provocando uma vergonha ao estado aflito do motorista. Como diria Schopenhauer: “o homem está sempre aflito e insatisfeito, correndo apressadamente, preocupa-se com o amanhã”. Então, nessa perspectiva, o jumento mais uma vez estaria em vantagem.

O motorista, ser “altamente pensante,” facilmente se convenceu das propagandas axiomáticas de caráter postulado, que divulgam as tecnologias e as potências de veículos que se dissipam como papel nas colisões. Desse modo, o olho do motorista que observa tais aparatos de “proeminentes grandezas” quase tudo pode enxergar, porém, ainda não conseguiu enxergar a si mesmo e, muito menos as limitações e precariedades dos veículos e das vias por onde transitam. Da mesma forma, como não conseguiu enxergar ainda a presença constante do jumento.

O motorista parece esperar uma conscientização do jumento ou mesmo, uma medida do poder público, o que é muito menos provável, levando em consideração a utilidade do jumento frente às espúrias ações do poder público. Sendo assim, apesar da igualdade entre o homem e o animal apontada por Sêneca, talvez não possamos colocar no mesmo nível o sereno jumento e o motorista de natureza obtusa que ignora a si mesmo, além de não perceber muitas coisas ao seu redor.

Enfim, em meio a essa circunstância, o grande temor é que um dia se esgote toda a paciência do jumento com o motorista.